Home page

21 de novembro de 2024

Responsável: Constantino K. Riemma


O Eremita: Conhece-te a ti mesmo e deixa as projeções!
Ana Maria Rangel
A alegoria da caverna, de Platão, conta a história de pessoas que, confinadas numa caverna, conhecem como realidade as sombras projetadas na parede para a qual olham desde sempre. Toda a sua visão de mundo e de si mesmos se resumia aos sons e imagens que ouviam e viam naquele espaço pequeno e escuro.
O Eremita - conhece-te a ti mesmo e a Caverna de Platão--
Uma representação da Alegoria da Caverna de Platão
Caso uma dessas pessoas conseguisse sair da caverna e enxergar o que havia por trás das imagens projetadas ela poderia perceber que o mundo é muito maior e mais complexo do que ela podia perceber anteriormente. Ela também perceberia que muitas das sensações e sentimentos que ela achava que eram causadas pelas interações com as imagens na parede na caverna talvez tivessem surgido por outros motivos, afinal. Essa pessoa poderia perceber-se maior, e sentir que tem mais poder sobre sua vida e escolhas através dessas percepções, e talvez se sentisse motivada a mostrar a vida lá fora para as pessoas que ainda permaneciam na caverna.
A vida e a morte de Sócrates, mentor de Platão, ilustram o que poderia acontecer a essa pessoa caso tentasse voltar e mostrar aos seus antigos companheiros as suas descobertas. ​Sócrates foi condenado à morte por promover um pensamento mais profundo acerca da natureza humana, o autoconhecimento, o pensamento investigativo e a expansão da consciência. A frase inscrita no pátio do oráculo de Delfos: "Conhece-te a ti mesmo e conhecerás os deuses e o universo" inspirou Sócrates, sua busca pessoal e sua filosofia. Com isso em vista, percebemos que a alegoria da caverna não fala, em verdade, de um mundo real escondido atrás de um mundo de projeções na parede da caverna.
O Eremita - conhece-te a ti mesmo - Sócrates
“A vida irrefletida não vale a pena ser vivida” (Sócrates)
Uma que pessoa passa boa parte da vida interagindo com as sombras na parede de uma caverna poderia muito bem, saindo dela, se enganar de novo com outras sombras, numa caverna maior e mais elaborada. Caso essa pessoa não se aprofundasse nos seus questionamentos ela poderia perder-se de si mesma, confundindo-se com as projeções e situações externas, eximindo de responsabilizar-se pela vida que vive: "naquela caverna em que eu vivia antes me enganaram, mas agora encontrei um lugar onde me dizem a verdade".
A grande questão levantada pela alegoria da caverna é sobre a capacidade do sujeito de enxergar a realidade através da sua própria percepção. A verdade é o que me dizem, é o que eu percebo, é o que eu enxergo, é o que eu sinto? É tudo isso ou não é nada disso? Se o mundo lá fora pode confundir, existe um espaço interno seguro o suficiente para que eu o use como referência? O que é real?
O nono arcano do Tarô trata do momento em que se torna necessário fazer esse estudo de si mesmo. O Eremita trata da introspecção necessária para percebermos quem ou o que realmente somos, já que a noção de "realidade" que alimentamos está diretamente ligada às experiências que vivemos e ao modo pelo qual encaramos essas experiências. Troco as experiências, mas continuo preso àquilo que ainda não resolvi em mim, seja na forma de um passado ao qual ainda me sinto vinculado, ou então através de sucessivas repetições de situações dolorosas.
​O sofrimento é um gatilho poderoso para iniciar um processo de autoconhecimento. Não por acaso, nos tarôs de Marselha, Waite e Thoth o Eremita olha para o lado esquerdo (passado), indicando que precisamos olhar, compreender e ressignificar aquilo que está mal resolvido. Num sentido mais profundo, olhar para trás é compreender onde surgiram as imagens inconscientes que servem de parâmetro para tudo o que chamamos de dor ou de alegria, de tristeza ou felicidade, para a raiz dos nossos apegos e aversões, para o cerne das nossas paixões. Essas imagens internas são a origem da realidade que experimentamos e que chamamos equivocadamente de destino. As experiências que vivemos são as projeções da nossa inconsciência.
O Eremita - conhece-te a ti mesmo - Rider-Waite-Thoth-Marselha
O Eremita nos tarôs Rider-Waite, Thoth e Marselha
O caminho do Eremita se baseia na auto-observação e na autoanálise e resulta no conhecimento de si mesmo. Para alcançar esse conhecimento, ou um vislumbre dele, é importante manter-se no lugar de aprendiz, como sintetizou Sócrates: "só sei que nada sei". Essa disposição humilde e sincera ajuda a manter firmeza no propósito e a ser compassivo consigo mesmo enquanto percebe seus próprios equívocos. Conforme vamos nos resolvendo, vamos nos centrando, respondendo às situações sem reagir, sabendo o que queremos sem impor a nossa verdade a ninguém, pois sabemos que a nossa vontade reflete o nosso mundo particular e interno. Dessa forma vamos nos integrando melhor aos ambientes em que estamos inseridos, aceitando a nós mesmos e aos outros como somos.
Quem vive um momento Eremita tende a valorizar mais a privacidade, a quietude e a solidão. É necessário tempo e espaço para processar as informações que recebemos no dia-a-dia, para compreender e aprofundar-se nas experiências. É bom permitir-se esse afastamento do burburinho e dos excessos da convivência, mas é preciso também tomar cuidado para não isolar-se demais a ponto de evitar experiências pelo medo de conhecer, enfrentar e/ou expor aspectos não tão agradáveis da nossa personalidade.
O aspecto sombrio desse arquétipo fala de desconfiança, de uma postura crítica e julgadora consigo mesmo e com os outros, um distanciamento sistemático das experiências cotidianas e da convivência com as pessoas, preocupações exacerbadas com a saúde e a própria segurança e um grande medo de ser rejeitado, disfarçado de virtude e preocupação com o autodesenvolvimento e a espiritualidade.
Eremita - conhece-te a ti mesmo - Taikomol
Taikomol - O Andarilho - no American Native Tarot
O Eremita parou de seguir o script da vida dita "normal", mas não com a intenção de ser rebelde. E ele naturalmente emana paz e tranquilidade, e também está mais aberto para a espiritualidade, mas não para ser virtuoso. Ele está observando-se, aprofundando-se nas experiências que sente serem importantes e dispensando aquelas que já não tem a ver com ele. Aqui há o despertar da consciência para a relação entre os acontecimentos externos e o estado de espírito interior, com a percepção de que ao mesmo tempo em que é afetado pelas experiências ele também influencia a manifestação. À medida que compreende o sentido daquilo que se passou (com ou sem ajuda terapêutica), clareando o que não havia sido bem elaborado e percebendo as consequências disso tudo na sua forma de estar no mundo, vai se liberando, dando-se conta das incongruências internas e das repetições em sua vida, tornando-se apto a aproveitar as oportunidades de expansão e crescimento que chegarão na energia do próximo arcano, A Roda da Fortuna.
Ana Maria Rangel é autora do livro
Tarô Integrativo Sistêmico - Guia Prático Para Iniciantes
e realiza atendimentos online e presencial : www.taro.cafe/index.html
Outros trabalhos seus no Clube do Tarô: Autores
Edição: CKR – 7/10/2019
  Baralho Cigano
  Tarô Egípcio
  Quatro pilares
  Orientação
  O Momento
  I Ching
Publicidade Google
 
Todos os direitos reservados © 2005-2020 por Constantino K. Riemma  -  São Paulo, Brasil