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Envenenamento mental |
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(o lado obscuro do oráculo) |
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Giancarlo Kind Schmid |
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Nossa mente ainda é um mistério para a ciência. Desconhecemos determinadas leis e fenômenos que envolvem nossa psique e sequer entendemos o modus operandi envolvido. Há algumas décadas, a Psicologia e a Parapsicologia vêm procurando encontrar respostas para os desafios e mistérios que cercam o inconsciente e todas as suas manifestações. Dos anos 90 para cá, a Neurociência vem buscando uma conexão das áreas neurais com o comportamento humano. Já a PNL (Programação Neuro Linguística) visa trabalhar com reprogramações cerebrais, feito um operador de informática. O processo se repete em práticas similares apoiadas na hipnose, em exercícios realizados por sistemas como o Silva Mind Control (ou Ultra Mind Control) e mesmo buscando a sabedoria ancestral dos kahunas, povo havaiano. Devido à complexidade de nossa mente, não sabemos o quanto podemos prejudicar alguém a partir de uma informação equivocada. Surge aí, o risco de fazer o outro se perder e cair numa armadilha. Chamo isso de envenenamento mental.
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Quando desenvolvemos a prática oracular é inevitável que venhamos interferir tanto em nossa mente, como na do consulente. Antes do advento da Psicologia, restringia-se o oráculo apenas ao mundo espiritual. Acreditava-se, basicamente, que as entidades do mundo astral se pronunciavam através do oraculista. Porém, com a conscientização de que a intuição é uma expressão espontânea do ser humano, parte dessa explicação tornou-se mito e a outra parte cabe a todos aqueles que trabalham “incorporados” durante uma leitura oracular, embora um bom número de praticantes se diga inspirado por “algo espiritual”. Creio que não é impossível que ocorram manifestações espirituais durante uma leitura, porém, o bom senso deve prevalecer e precisamos reconhecer nosso grau de participação, já que o conhecimento simbólico é o primeiro passo para domínio da prática.
Ao trabalharmos com símbolos, naturalmente aguçamos determinados canais (sutis) em nosso ser. A intuição se torna latente, pois o símbolo provoca uma abertura entre o consciente e o inconsciente. Muitas pessoas relatam que passaram a lembrar com mais frequência de seus sonhos, os insights ficaram mais intensos, e a percepção e sensibilidade ao mundo à volta desenvolveram-se. O artista que trabalha com imagens (ou o imaginário) costuma experimentar as mesmas sensações, embora não comprometa-se com algum tipo de interpretação simbólica, deixando ao encargo do observador a compreensão de sua obra.
Cabe ao oraculista a responsabilidade de transmitir corretamente a interpretação a partir da simbólica revelada. Costuma-se dizer, por exemplo, que o tarô NUNCA erra e que é o tarólogo o equivocado; penso que tudo esteja entremeado, ou seja, se o tarô (enquanto oráculo) precisa da voz do intérprete para “ganhar vida” e, se este não estiver devidamente preparado e amadurecido interiormente poderá “conduzir a leitura”, forçando inclusive a uma compreensão errônea por parte do consulente. Devo lembrar que o tarô, por si só, não tem autonomia se não existir o praticante. E, se este não tiver o domínio da interpretação, o tarô mais confundirá do que elucidará. A leitura oracular, seja ela qual for, pode levar o consulente às alturas ou empurrá-lo para um abismo.
Preocupo-me, particularmente, com a imposição interpretativa. Quando o oraculista faz a revelação e não dá margem de escolha para o consulente, tratando o assunto de forma fatalista, costumo chamar de envenenamento mental. Trata-se de uma programação mental negativa através da qual o indivíduo se torna escravo (por temor ou insegurança) da informação, crendo de tal forma nesta, que será capaz de materializar o quadro. Há uma frase em Jó (na Bíblia) que diz: “porque aquilo que temia me sobreveio e o que receava me aconteceu” (Jó, 3:25). Essa é uma frase muito ilustrativa de como o medo pode interferir nos acontecimentos e mudar o rumo dos fatos a partir de nossos pensamentos.
Considero o envenenamento mental o lado mais obscuro do oráculo (da leitura oracular). É a forma mais típica do oraculista manipular o consulente, que se coloca sem defesas, receptivo e totalmente crédulo diante da leitura oracular. O grande despreparo dos praticantes coloca em risco importantes decisões e rouba a autonomia de quem o procura, tornando-o incapaz de livres escolhas perante a vida. O oraculista ganha “poder” por considerar-se “dono do destino” do consulente, gerando dependência por parte deste. Quanto maior o medo do consulente, maior será a angústia em obter determinadas respostas (aumentando a procura) e, consequentemente, maior será a influência do praticante perante aquele que consulta. Ou seja, o oraculista passa a “ganhar” em cima da desgraça do outro.
As leituras sobre o futuro costumam vir carregadas de vícios. Quem se acostumou a falar de mortes, separações, acidentes, doenças, falências e outras fatalidades da vida, não tem preocupação alguma em passar as informações ao consulente (para quem interpreta, é como se estivesse falando de futebol). Para quem transmite pode até parecer normal, mas para quem ouve, é impactante. Por isso, as leituras devem (cada vez mais) evitar visões catastróficas do futuro e, caso seja necessário abordar tal(is) assunto(s), a forma de conduzir a interpretação deve ser suave, sem transparecer para o consulente que não há escapatória ou nada pode ser feito. Nosso papel é o de preparar o consulente para a vida, capacitando-o à superação de si mesmo e dos obstáculos pelo caminho; se colocamos o problema sempre maior que o consulente, estamos obrigando-o covardemente a um tipo de sofrimento, e este se tornará uma espécie de expectador imobilizado pelo medo, assistindo as desgraças como um filme de terror.
Fundamental que o oraculista esteja centrado e não leve para dentro da leitura os seus problemas. Muitos casos de envenenamento mental se dão por projeções do praticante em cima do consulente, levando a crer que a solução do problema não há de chegar porque problema similar vivido pelo praticante não está sendo resolvido a contento. O nível de isenção deve ser alto, para não ocorrerem julgamentos pessoais que interfiram na interpretação final da leitura. Vale lembrar que somos intermediários, apenas intérpretes do oráculo e a leitura pertence ao consulente, e não a nós.
Previsões normalmente são passíveis de mudanças. Aquele que crê que o futuro está totalmente delineado, escrito, está equivocado. Nossas ações e decisões no agora constroem o nosso futuro, basta que conscientemente sejamos capazes de assumir a nossa vida e dispor-nos a mudar. Quem prevê o futuro sem dar a liberdade de escolha ao consulente está roubando-lhe a liberdade de ser e também, de ter.
Sempre que realizar uma leitura para alguém, tenha cuidado no que vai dizer. O consulente espera de nós soluções (na forma de dicas, sugestões e opções, e não mais problemas), não se torne um oraculista portador de maus augúrios, sempre ofereça uma saída, por mais simples que ela pareça. Oferecemos escolhas e não escrevemos a vida de ninguém.
BIBLIOGRAFIA:
LEWIS, H. Spencer. Envenenamento mental. Rio de Janeiro : Renes, 1983 (Biblioteca Rosacruz, vol. 19).
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08/12/2009 13:20:57
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Mauricio - 12/01/2010 19:46:03
Excelente abordagem; creio que essa postura mais "imparcial" junto ao consulente numa consulta é uma das chaves para uma boa interpretação e elucidação de algum tema ou pergunta feita. Ética e empatia são fundamentais em tal prática, além de muito respeito e carinho para aqueles que nos procuram em busca de uma análise focada no auto-conhecimento deles. Abraços e muita Luz
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Giancarlo Kind Schmid - 13/01/2010 22:53:19
Oi Mauricio, Obrigado pela sua visita e participação! Falou tudo. É exatamente o que penso. Abraços!
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ruth sznai - 02/02/2010 22:53:23
Embora o inicio de sua explanacao me pareca impactante e merece mais pesquisa,concordo em numero e grau com relacao ao papel do tarologo,preciso resolver melhor este fato para vir a ser uma tarologa,vejo muita incerteza na leitura que faco,acho isto antietico,que vc me diz a respeito,
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mariah beheregaray - 20/02/2010 11:03:58
Sou trabadora do mundo mágico da interpretação dos oráculos. Tenho sempre ''o maior cuidado com a informação que devo passar'' para meu consulente. Ele está ''alí'', para obter uma ''possível'' saída,portanto, minha responsabilidade...e..cuidado tem que ser redobrado para não ''acontecer um envenenamento de sua mente'.
Ah!...estou adorando participar e receber conhecimentos atraves desse forum.... grata pelos conhecimentos compartilhados. abraços MARIÁH
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Rute Moabita - 21/02/2010 16:45:30
Olá, Giancarlo,
Gostei muito do seu texto, sou taróloga há vários anos, e a sua preocupação com o envenenamento mental é minha também, me preocupo muito em enxergar um caminho ou uma saída para o problema que o consulente me traz, e costumo indicar várias terapias ou soluções para que a pessoa saia do problema apresentado.
Mas gostaria de deixar aqui uma questão que me incomoda, que é, além da preocupação do tarólogo em ser ético e mostrar um caminho através do tarô, é a predisposição do consulente em encontrar a saída e resolver seu problema.
Porque encontro muitas vezes consulentes que querem que EU resolva seu problema, ou não querem fazer NADA para mudar uma situação complicada, ou um comportamento negativo.
Então nestes casos, a situação do tarólogo é mais delicada ainda, tendo que trazer o consulente à realidade e perguntando.... você quer mesmo se livrar deste problema??????
Deixo aqui esta questão, como tema de discussão.
Um grande abraço.
Rute Moabita
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Maria Elisa Fernandes - 26/02/2010 17:07:32
Gian...magnífico artigo sobre Envenenamento Mental, parabéns. Você abordou um tema importantíssimo e realíssimo e o que é pior....acontece meeeeesmo com os despreparados. Super bem escrito, objetivo e com toda a seriedade e conhecimento que você possui. Grande alerta aos iniciantes e aos que se envaidecem por serem bengalas dos consulentes. PARABÉNS!!!! Valeu muito!!!
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Giancarlo Kind Schmid - 27/02/2010 18:04:57
Prezada Ruth, Agradeço sua visita e comentários. Infelizmente, muitos estão despreparados para lidar com essa poderosa ferramenta simbólica que é o tarô, arriscando de forma inconsequente leituras que podem prejudicar os consulentes. O bom tarólogo precisa, antes de qualquer coisa, ser uma pessoa bem resolvida para evitar projetar seus dramas pessoais na análise de seu cliente e ser isento o suficiente para não emitir opiniões pessoais que influenciem nas decisões cruciais do próximo. Ou seja, o tarólogo precisa ser alguém esclarecido e centrado, no mínimo. Abraços!
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Giancarlo Kind Schmid - 27/02/2010 18:13:13
Oi Mariah, Seja bem vinda! Sua preocupação é fundamental e deveria ser regra entre TODOS os oraculistas, sem exceção. Quando fazemos previsões, devemos nos lembrar que não somos deuses detentores de um poder absoluto de dominar/controlar/manipular o futuro e sim, orientadores capazes de adiantar ao consulente as possíveis dificuldades em seu caminho, capacitando-o a descobrir por si mesmo os meios para contornar os obstáculos, obtendo, com isso, uma melhoria em sua qualidade de vida. Problemas sempre hão de existir, infelizmente nós, tarólogos (e outros oraculistas), somos procurados quando o consulente encontra-se normalmente sob aflição; cabe a nós esclarecermos, de forma concisa, delicada e coerente que a dificuldade é apenas mais uma forma de aprendizado, oferecendo ao indivíduo força para vencer e fé para superar, além de entendimento. Saber como e quando dizer algo, faz uma diferença enorme! Abraços!
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Giancarlo Kind Schmid - 27/02/2010 18:27:15
Oi Rute, Obrigado pela sua visita, preciosos comentários e apropriadas observações. Por experiência própria, constato que não há mudança no outro se este não se permitir realizá-la. Muitos se esquecem que melhorias alcançadas em qualquer setor de vida se iniciam com uma mudança de postura interior, uma alteração de consciência, aceitação da realidade e capacidade de recomeçar. Nosso papel é o de, antes de qualquer antedimento, esclarecermos ao consulente a que nos propomos, qual o trabalho que realizamos e que o objetivo almejamos. Tenho uma técnica, muito particular, através da qual me valho no método do Mandala o uso dos Arcanos Maiores invertidos ou em pé; quando invertidos para mim que realizo a leitura, friso que é o consulente quem está criando aquela situação anunciada pela combinação de arcanos (Maior + Menor). Quando em pé, sinalizo que é um fator externo ao consulente, gerado por terceiros, ou produto do meio. Desde então, deixei de ter problemas quanto a consulentes que acham que somos nós quem devemos resolver seus problemas: faço-o entender que, ao surgir um arcano invertido, ele mesmo é quem está criando aquela situação. Nosso papel não é apenas de reveladores, mas somos em parte também educadores, necessitamos conscientizar o consulente de sua parcela de responsabilidade diante dos problemas vividos. Do contrário, os dramas continuarão a se repetir, pois é do ser humano buscar o conforto e segurança, aguardando soluções mágicas para seus problemas. Se nós não soubermos nos impor, o consulente sempre achará que, por pagar pelo serviço, que seremos capazes de resolver os seus nós, como a velha história do "trago o seu amor em 03 dias". Ora, não há amor que retorne se a pessoa envolvida não for merecedora deste. Assim como a saúde não melhora se não houver mudanças de hábitos, o emprego não aparece se não procurá-lo, o mal entendido não se resolver se não houver conversa. Tudo depende de ação, seja do consulente, seja do universo. Abraços!
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Giancarlo Kind Schmid - 27/02/2010 18:41:01
Oi Maria Elisa, Valeu pela sua visita, querida! Você tocou num ponto crucial: os consulentes nos colocarem como "bengalas" para si. Cabe ao tarólogo impor respeito e conduzir sua análise com realismo. Nenhum "anjo de guarda, mestre ascenso, guia espiritual ou mentor" ajudará o indivíduo, se este não fizer a sua parte. Ainda há os que nos confundem com aqueles que realizam trabalhos espirituais para destrancar caminhos ou fazer amarrações. Tudo é fruto de um sincretismo que vivemos em nosso país e, com todo respeito aos religiosos e religiões envolvidas em tais práticas, considero negativo a confusão que se faz com as cartas e cultos particulares. Se ainda somos "bengalas", é porque há ainda um ranço do final do século XIX e início do século XX onde o cartomante ou tarólogo era destinado a realizar práticas espirituais para atender o público. Essa mácula fica clara numa obra de um escritor famoso, Machado de Assis, que em seu conto "A Cartomante" ridiculariza o papel das adivinhas dos idos do século XIX. Se algo deve ser mudado, deve começar por nós, praticantes, do contrário, continuaremos a ser o esteio psicológico/espiritual de muitos, não permitindo que cada um cresça por si mesmo. Abraços!
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