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04 de dezembro de 2024

Responsável: Constantino K. Riemma


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O tarô como recurso terapêutico
(uma via para o autoconhecimento)
Giancarlo Kind Schmid
  Há pouco mais de 20 anos surgiu um movimento nos EUA e Europa com o propósito de integrar o tarô às atividades psicoterapêuticas. Embora discreto inicialmente, essa tendência ganha grande força hoje e vários adeptos surgiram em nossa década, associando o oráculo a diversas vertentes terapêuticas, revelando que o tarô é muito mais do que um simples instrumento para previsões.
 
Na história, o tarô surge originalmente como jogo de cartas comum  com fins de entretenimento. Atravessou 04 séculos popularizado como atividade lúdica, e somente no século 18 ganhou status oracular, objetivando revelar o futuro e conexão com a magia. Em pouco mais de dois séculos, foi alçado a instrumento simbólico com foco terapêutico.

A pergunta que precisamos fazer é: "em que o tarô se transformará nos próximos anos?". Sim, os conceitos mudam, as tendências tornam-se outras, estamos deixando a "Era da Fé" (Peixes) para entrar na "Era do Pensamento" (Aquário) e, como esse oráculo tem seus fundamentos no simbolismo, natural que acompanhe a revolução inconsciente coletiva, onde o homem  "não quer apenas saber para onde vai, e sim, quem é e a que veio".

Nos idos dos anos 80, um grupo de psicólogos americanos resolveu experimentar o uso das imagens dos arcanos para trabalhar com seus pacientes. A idéia era estimular livre associações a partir de cada lâmina (carta) escolhida aleatória ou propositalmente. Seus registros e observações propunham estabelecer uma ponte entre o inconsciente de seus pacientes e as imagens arcanas, permitindo "dar voz" a conteúdos que teimavam em se manter reprimidos. A experiência, reservada por assim dizer (pois temiam que psicólogos mais ortodoxos viessem a atacar a prática), foi um sucesso, a ponto de conseguirem não só estimular uma relação mais direta com suas histórias pessoais íntimas, como também conhecer melhor o perfil daqueles internados.

Vinte anos se passaram e o tarô tornou-se uma espécie de "bússola para o autoconhecimento". Certamente, não o seria se não tivéssemos travado contato com as pesquisas do psicanalista suíço Carl Gustav Jung, percursor de algumas idéias que hoje estão relacionadas ao oráculo, como a compreensão do universo simbólico, as manifestações arquetípicas, a natureza do inconsciente e as tipologias psicológicas. Falar de tarô hoje sem citar termos como "arquétipos", "inconsciente coletivo", "sombra", "persona" e outros, é como excluir-se da modernidade alcançada por esse oráculo. Preocupante, porém, é a abordargem de tal tema desconhecendo tecnicamente tais termos (mas esse é um assunto para outra ocasião). Tudo que está em alta, infelizmente, vira modismo.

Existe ainda resistência ao aceitar tais fatos. Alguns sentem-se incomodados com a possibilidade de desviar o tarô do foco adivinhatório (termo esse caindo em desuso popularmente) para o foco terapêutico. Esquecem-se que o símbolo é plástico e pode ser aplicado (adaptado) a qualquer coisa. Daí a gama de correntes em torno do tarô, permitindo espaço para todos. Porém, a tendência do homem futuro é querer conhecer-se ainda mais, pois não há amanhã sem o agora. Apresentar o futuro sem capacitar o consulente, é o mesmo que enviar alguém a uma viagem sem mapa e destino.

O tarô é composto por 22 arcanos maiores e 56 arcanos menores. O primeiro grupo agrega um tipo de simbolismo, digamos, mais universalizado, a que chamamos de imagens arquetípicas. Tratam de temas comuns a todas civilizações (do nascimento à morte, do poder à ruína, do céu à terra, do bem ao mal, etc.). Plasmam 22 tendências humanas, 22 níveis de consciência, 22 formas de manifestação da vida. Devido à sua pluralidade simbólica, são perfeitamente úteis para descrever comportamentos humanos. Já o segundo grupo distribui-se em 04 naipes, cada qual podendo ser associado a um plano ou tipologia psicológica (Ouros=terra, sensorial; Espadas=ar, racional; Copas=água, sentimental; Paus=fogo, intuitivo). Estes, já são capazes de revelar nossa relação com o meio e as preocupações naturais de todos nós (ter um amor, uma carreira, recursos, saúde, família, sucesso, amigos, estudar, etc.). A combinação dos dois grupos insere o ser humano no seu contexto de vida.

Como o tarô pode ser aplicado terapeuticamente? Preferindo não complicar-me em explicações técnicas e tornar-me prolixo, pensemos que o símbolo é importante veículo de comunicação entre consciente e inconsciente. O que cada arcano realiza, é uma transferência de conteúdos psíquicos até então "invisíveis" à consciência, para a observação e interpretação objetiva. A qualidade desses conteúdos é revelada pela qualidade de cada lâmina, permitindo ao leitor, em sua sensibilidade e intuição, decodificá-los para o consulente na forma de orientações e sugestões. O processo do autoconhecimento ocorre no momento em que o consulente utiliza essas informações para si como  ferramentas para a transformação pessoal, permitindo a superação de suas limitações e crises.

Das práticas terapêuticas conhecidas (integradas ao tarô), destaco as mais populares que vem arrebatando estudantes e pesquisadores diversos:

1) Tarô e Psicologia - alguns psicólogos (principalmente junguianos) europeus e norte americanos  (e aqui mesmo do Brasil) vêm adotando o tarô como um plus psicoterapêutico. Tudo aquilo que não conseguem detectar na análise em consultório, o tarô consegue revelar e permitir uma maior abrangência no tratamento. Importante ressaltar que o tarô não invalida ou substitui a Psicologia tradicional, apenas soma, amplia a capacidade de entendimento do profissional. O Conselho de Psicologia não aceita a atividade, mas lá fora a resistência é bem menor.

2) Tarô e Florais - relacionando os arcanos às essências dos mais diversos repertórios, ou mesmo as combinações entre os arcanos, a prática começou a ganhar força nos anos 90. Valendo-se de métodos específicos (ou não) o tarólogo identifica o momento psicoemocional do consulente, sugerindo-lhe uma receita a ser ministrada durante um certo tempo. O tarô, nesse caso, substitui a entrevista anamnésica para levantamento biopsíquico do consulente.

3) Tarô e Meditação - na verdade, após o boom hippie e a divulgação maciça da filosofia oriental nos anos 70, alguns praticantes mais ousados passaram a usar o tarô para meditações diárias. Essa sugestão, mesmo que implícita, nasce com as correntes ocultistas oriundas de magistas como Crowley, C.C. Zain, Ouspensky e outros. Trata-se de uma prática onde o usuário das lâminas refletirá sobre o seu momento, um assunto qualquer, suas ações e decisões, visando alcançar uma clareza interior. Alguns praticantes usam apenas um arcano, outros trabalham com métodos, tratando-se de algo muito particular.

4) Tarô e Arteterapia - transformar as imagens do tarô em arte. Quando o ocultista Zain sugeriu que pintássemos nossos baralhos, essa prática tornou-se uma forma de arteterapia rudimentar. Hoje, a prática agrega várias  expressões como a dança, escultura, modelagem, pintura, poesia, música dentre outras. O objetivo é atenuar as tensões do praticante e permiti-lo relacionar-se de forma direta com as suas emoções mais profundas, "desbloqueando" a psique.

5) Tarô e Oniroterapia - usando os arcanos do tarô para compreender melhor os sonhos. Na verdade, a idéia é realizar uma ponte entre o conteúdo simbólico dos sonhos com o dos arcanos. A partir daí, criando-se uma associação entre os polos simbólicos, somos capazes de acessar conteúdos profundos que remetam ao momento psíquico do consulente.

Há outros tipos de práticas terapêuticas envolvendo o tarô, a citar a Cinesiologia, Programação Neurolinguística, Física Quântica, Teatroterapia,  Cristalterapia, dentre outras áreas ainda em fase de desenvolvimento e descobertas.

Creio que em mais vinte anos, será impossível desconciliar o tarô das vertentes terapêuticas. Urge, em nossa sociedade, o desejo de saciar o chamado íntimo que nos leva irremediavelmente ao caminho do autoconhecimento (lembrando que essa jornada iniciou-se na Grécia séculos antes de Cristo através do axioma "conhece-te a ti mesmo").


FONTES BIBLIOGRÁFICAS:


GILLES, Cynthia. O Tarô, uma história crítica – dos primórdios medievais à experiência quântica. Editora Pioneira. São Paulo, 1994.

JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Obras completas de C. G. Jung. Vol IX/1. 2. ed. Vozes. Petrópolis, 2002.

MARQUES, Ednamara Batista Vasconcelos e. O Tarô. Das correlações arquetípicas à função terapêutica. Editora Florais de Minas. Itaúna, 2004.

NICHOLS, Sallie. Jung e o Tarô. Uma jornada arquetípica. Editora Cultrix. São Paulo, 1997.

PRAMAD, Veet. Curso de Tarô e seu Uso Terapêutico. Editora Madras. São Paulo, 2004.

ROSENGARTEN, Arthur (Dr PhD). Tarot and Psychology. Spectrums of Possibility. Paragon House, St. Paul, Minnesota, 2000.
 
09/11/2009 23:20:34

Comentários

Lu Lebel - 16/11/2009 00:41:38
Oi, Gian!
Para variar muito bom seu texto. É uma pena que não possamos utilizar o tarot oficialmente na psicologia. Infelizmente, isto se dá pq uns e outros acabaríam por delegar as responsabilidades de seu atendimento psicológico às entidades invisíveis, a canalizações, à magia oracular, etc...enfim o conselho de psicologia coloca isso na posição de crendice, é um terreno arenoso para uma organização de controle e fiscalização. Mas sem dúvida, o tarot é algo de ótima utilidade sendo bem utilizado de modo terapêutico, sem a postura mistificadora, trazendo a reflexão, a auto-consciência e o colocando o consulente não como uma vítima do seu destino, mas alguém que realmente busca sua individuação, seu eu verdadeiro, em um processo ativo. Parabéns!bjs!

Giancarlo Kind Schmid - 16/11/2009 13:07:29
Oi Lu,
Que legal te ler por aqui.
Valeu pelos elogios!
É fato que a resistência do CRP quanto às práticas ditas "alternativas" (florais, meditação, regressão, astrologia, tarô, reiki, etc.) se deve à essência espiritualista na qual estão inseridas, já que a Psicologia se propõe a ser alçada à ciência e não deseja ser associada a nada que não seja "objetivamente comprovável" e mistificado.
Por outro lado, há uma grande gama de psicólogos hoje que combinam as atividades, mesmo que "trabalhando ocultamente aos olhos do CRP". Por constatação, realmente não são poucos. De duas, uma: ou o Conselho faz vista grossa ou não consegue controlar a grande quantidade de profissionais que se enveredam por tais caminhos. Bom, tem muita coisa que muda com o tempo, mesmo que vagarosamente, tomemos por exemplo a Acupuntura que sequer era aceita no meio médico e hoje é especialização reconhecida pelo CRM. Não vou afirmar que ocorrerá o mesmo com o tarô, mas sabemos que são os profissionais de lá de fora quem ditam as regras e eles estão buscando novidades. Uma grande quantidade de junguianos aceita o tarô como um importante instrumento simbólico, assim como a astrologia, então isso já é um bom sinal de abertura. Adotarem o oráculo como plataforma terapêutica, "são outros quinhentos".
O lado positivo de tudo isso é que movimentos estão acontecendo. Muitas obras estão sendo publicadas integrando os assuntos (tarô e psicoterapias). Estamos vivendo um novo momento do tarô, ímpar, que representará um novo meio de pesquisas e práticas. Para os olhos de quem procura a magia nele, continuará sendo mágico; para quem busca o lúdico, continuará sendo o lúdico; para quem se propõe ao terapêutico, será o terapêutico. O tarô obedece a ótica de quem o utilizada, ele é livre em essência, nós é quem damos sentido e significados a ele. O fundamental é que ele seja uma espécie de bússola para os anseios anímicos e ajude-nos na construção de uma consciência maior (de nós mesmos e de mundo).
Beijos!

Alina Eucaris - 16/11/2009 14:05:33
Gian:
Gosto quando você traz esta questão do tarô como instrumento terapeutico, pois reduz um pouco o estigma em torno de que a sua função principal é a "adivinhação". Sou psicóloga e descobri que o Tarô é um meio eficaz capaz de mobilizar conteúdos significativos do cliente, para serem trabalhados na psicoterapía, e muitas vezes alcança coisas que outras técnicas não conseguem.
Portanto, continue com este tema, pois a maioria dos psicólogoa sentem-sem perdidos quando se identificam o Tarô e se deparam com a questão " o que posso fazer com ele na m inha profissão"

Giancarlo Kind Schmid - 16/11/2009 15:12:28
Oi Alina,
Obrigado pela visita e comentários.
Você é um bom exemplo de como há psicólogos trabalhando com o tarô através da psicologia. Como você está diretamente relacionada às duas práticas, sabe melhor do que ninguém que é possível a combinação desses dois recursos. Isso não invalida o aspecto oracular do tarô. Porém, fazer previsões HOJE requer que apresentemos a responsabilidade do consulente perante seu futuro; apenas afirmar o que vai acontecer amanhã sem conscientizar o indivíduo, está demodé.
O tarô facilita o acesso "aos pontos cegos" e isso é bastante satisfatório. A Psicologia cumpre seu papel racional de centralizar o paciente e o tarô oferece pela via intuitiva o cabedal de informações para aprofundamento da análise (fazendo, muitas vezes, tanto terapeuta como paciente ganharem tempo).
Pode ter certeza que continuarei com o assunto sim. Minha intenção é abordar todas as conjunções terapêuticas possíveis com o tarô e oferecer boas informações.
Abraço!

Valquiria - 16/11/2009 15:31:06
Olá, Gian!
Adorei o texto e compartilho da opinião da Lu Lebel. Está crescendo cada vez mais o número de psicólogos que combinam suas atividades com as práticas ditas alternativas. Ao menos é esta a impressão que tenho! Felicidades!

Giancarlo Kind Schmid - 16/11/2009 15:41:39
Oi Valquiria,
Valeu pela visita!
Inevitável que o movimento cresça, essa é uma tendência (não é impressão sua não). Se, tanto o tarô com a psicologia tratam da alma humana, não vejo porque haver rejeição de uma das partes. Quando a moderna psicologia descobrir o potencial simbólico do tarô, fará maravilhas em suas pesquisas, avanços incríveis acontecerão. Tudo é uma questão de tempo. Creio piamente que isso ocorrerá no futuro (não tão longínquo).
Abraço!

Paola Caumo - 16/11/2009 18:29:35
Oi Gian,
Adorei o teu texto. A possibilidade de usar o tarô como instrumento terapêutico para mim faz muito mais sentido do que ser apenas, uma arte divinatória. É claro que o que move as pessoas em busca do tarô é a curiosidade pelo futuro. Em sua maioria buscam uma solução mágica para seus problemas. Mas, a partir de uma consulta, se elas estiverem abertas, muitos frutos podem ser colhidos no caminho do autoconhecimento. Isso é muito bacana. Estou interessada em aprender tarô e gostaria de pedir a gentileza de uma indicação tua para um curso. Moro em Porto Alegre/RS e quero conhecer esse instrumento com pessoas que trabalhem sério e concebam o ser humano de uma forma holística.
Abraços,
Paola

Giancarlo Kind Schmid - 16/11/2009 18:55:32
Oi Paola,
Obrigado pelos seus comentários e gentil visita.
Sim, faz parte do ser humano a busca e compreensão do futuro, isso acompanha a humanidade há milênios e muito provavelmente foi o que ajudou a divulgar os tantos oráculos existentes. Delfos (na Grécia), por exemplo, enriqueceu e se tornou referência geográfica à época (para todos que ali peregrinavam), devido à fama do oráculo. Acho que o mais importante é compreendermos que nenhum deus fala por nós, ou que somos encarregados de transmitir a vontade divina, o oráculo tornou-se um revelador de tendências em consonância com o nosso livre arbítrio. O fato de haver tanta procura para vislumbre do futuro, é a necessidade de segurança e proteção, constante em nossa natureza. Saber onde se pisa gera alívio e dá uma certa tranquilidade. Porém, sem ação não há futuro, então, cabe a nós, tarólogos, educar o consulente para a sua jornada. Isso se faz conscientizando o indivíduo das decisões que pode tomar e escolhas a realizar.
Se tiver interesse num curso terapêutico, escreva-me: gianks@taroterapia.com.br ou visite meu site: www.taroterapia.com.br (realizo cursos à distância via SKYPE ou MSN).
Abraço!

Mercedes Requena - 16/11/2009 20:55:22
Olá, Gian

Eu também uso o tarô com a abordagem terapêutica pois considero que atualmente temos informações suficientes que nos mostram como somos os construtores de nosso destino e quebrar os antigos paradigmas deterministas que acompanham o tarô. Isto é uma tarefa de todo o profissional que não está satisfeito com a banalização de uma consulta apenas adivinhatória. Muitas vezes o público que nos procura já vem com este modo antigo de ver uma consulta de tarô, mas cabe a nós explicar e orientar o cliente

Fico feliz que esta mentalidade esta mudando e, melhor ainda, está tomando corpo, promovendo pesquisas com o intuito de utilizar uma sessão de tarô como uma terapia breve, como no meu caso, onde tenho condições de mostrar ao cliente seus pontos fracos e fortalecê-los, pois só assim terá condições de superar e transmutar os desafios que a vida apresenta. O cliente deixa de ser passivo, à espera de um acontecimento previamente "revelado", para ser um agente transformador de seu destino.

Mercedes

Giancarlo Kind Schmid - 16/11/2009 21:24:56
Oi Mercedes,
Agradeço sua visita e pertinentes comentários.
É isso mesmo: nossa função é preparar o consulente para a vida, ajudando-o a compreender que é a ação o primeiro passo para as mudanças.
Sim, a mentalidade está mudando (e bem mais rápido do que eu cogitava). Conversando com alguns tarólogos-terapeutas lá de fora, percebo que há uma onda de entusiasmo quanto ao trabalho presente. Nosso país é um dos que mais abraça a proposta, basta ver a quantidade de sites focando o assunto.
Abraços!

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