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Dramas afetivos e vícios oraculares |
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(o tarô ajuda ou atrapalha a vida sentimental?) |
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Giancarlo Kind Schmid |
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Ao longo desses 13 anos que venho freqüentando a rede através de variados fóruns, listas virtuais, Orkut e dezenas de comunidades, vim observando a insistente procura pelo tarô (e outros oráculos) para questões predominantemente afetivas. Se não fosse o fato dessa procura aumentar com a oportunidade de oferecimento de leituras gratuitas e interpretações variadas (devido ao enorme número de participantes – muitos desses curiosos, inexperientes, estudantes e agitadores – que se valem da rede para “profissionalização” da prática), diria que o interesse pelas leituras abertas existe pelo simples fato de estarem à mão sempre que é preciso, gerando até uma certa irresponsabilidade proveniente da exposição de assuntos íntimos e desrespeito para com os praticantes que procuram defender a seriedade da profissão.
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Amor... um tema sempre delicado. Seria inocência de minha parte negar que a procura ao tarô seja em sua maioria para outro assunto qualquer. Sim, o âmbito financeiro e profissional tem sua importância, mas no fim das contas, todos querem saber como anda a sua relação ou se encontrará a sua “metade da laranja”. Esse é um comportamento inerente ao ser humano, basta ver que, ao longo da História, os romances destronaram reis e sucumbiram até impérios. Em alguns casos, até delegaram poderes a uns e glórias a outros. Mas, hoje, em pleno século XXI, estamos diante dos mesmos dilemas amorosos que movem homens e mulheres de toda a Terra. O que talvez ainda não aprendemos inteiramente, é como fazer do tarô (e outro oráculo) um meio que auxilie o(a) consulente a crescer emocional e psicologicamente, de forma a não se sujeitar a erros que repetem-se insistentemente levando-o a fazer do oráculo uma “muleta” e não “uma ponte para a superação pessoal”.
O primeiro e maior erro de uma grande maioria de tarólogos é apenas responder o “arroz com feijão” nas questões amorosas; perguntas do tipo “ele(a) me ama?”, “ele(a) tem atração por mim”, “a relação vai dar certo?”, “Fulano(a) ou Beltrano(a) é minha alma gêmea?”, “o que a pessoa está pensando sobre mim?”, dentre outras perguntinhas básicas que movimentam as redes internet afora, representam apenas tentativas (muitas vezes frustradas) de buscar o amor sem saber como fazê-lo. A premissa fundamental acaba ficando de fora, quando apenas são respondidas as questões com jogos do tipo “sim ou não”: o(a) próprio(a) consulente. O foco exclusivamente no outro é um erro crasso, pois o referido (centro de interesse do consulente) não participa da leitura, não pode argumentar, discutir, questionar ou se defender das observações de quem nos procura, muitas vezes equivocadas, já que se tratam de impressões muito particulares recheadas de projeções e vicissitudes (experiências afetivas de outrora).
Quando, numa leitura, focamos no objeto de desejo do(a) consulente ou somente na relação, estamos tirando a responsabilidade do consulente em aprender a lidar com as próprias falhas e limitações. Muito bem, todos tem o direito de amar, desejar, se apaixonar, mas tais expressões sentimentais encobrem recalques e inseguranças capazes de transformar o mais caloroso romance num “inferno de Dante”. Total covardia de nossa parte acusar o(a) parceiro(a) de quem atendemos do fracasso do relacionamento, como se quiséssemos poupar o nosso cliente de críticas ou advertências, uma vez que ele nos paga e tememos perdê-lo para “outro profissional cheio de firulas interpretativas”.
Enquanto não colocarmos o(a) consulente no centro da questão, conscientizando-o(a) de seu papel e influência no drama afetivo que vive, manteremos quem nos procura permanentemente em estado infantilizado, cuja incompetência de conduzir uma boa relação dará lugar a respostas pouco racionais de nossa parte, do tipo “você não é feliz afetivamente porque é carma, por isso não encontra ninguém à altura”. Pontuação simplista que alivia nosso lado (já que nos livramos do “peso” do problema) acomodando o cliente diante de sua dificuldade.
É impressionante o número de consulentes que saem de um provável romance e já estão na semana seguinte visando outro, sem dar tempo para reconhecerem onde ocorreram as falhas. Daí, as comunidades virtuais “fervem” com historinhas contadas das mais variadas formas, muitas delas com aquela velha desculpa que “a minha vizinha, ou irmã, ou amiga, ou colega de trabalho está interessada num cara e quer saber se a relação dará certo?”; ora, quando a situação chega a esse pé, é sinal que a pessoa já está tão viciada na consulta oracular que é capaz até de modificar a pergunta para a mesmíssima questão, só para assegurar que a resposta anterior “calhará” com a nova obtida. Quando não, temos internautas que espalham as mesmas questões em dezenas de comunidades diferentes ( para “tirar a prova dos nove”) e no final, condecorarão o(a) "tarólogo(a)" - “puxando-lhe o saco” - que lhe dirá exatamente o que queriam ouvir (ou ler). Conclusão: as relações acabam novamente fracassando, os mesmos internautas voltam às comunidades em busca de novas respostas e o ciclo vicioso se completando com novas leituras superficiais oferecidas pelos mesmos curiosos, inexperientes, estudantes e agitadores (raríssimos casos, profissionais sérios – porque quem é sério, não vai se prestar a isso). Resultado: alguns "tarólogos" com ego inflado, porém, consulentes altamente desiludidos.
Volto a frisar que o tarô deve ser um instrumento para educar e orientar e não realizar previsões vãs. As cartomantes vivem cheias de clientes pelas mesmíssimas razões e, se por acaso algo dá errado, é o tarô ou outro método de previsão que será maculado, pois o cartomante da esquina continuará a atrair novos incautos. Não estou desmerecendo o esforço de praticantes sérios e responsáveis, mas está mais do que na hora de tornarmos os nossos consulentes pessoas conscientes de seus atos, escolhas, posturas ou limitações, competindo a nós, tarólogos, prepararmos o indivíduo em sua escalada de vida. Precisamos urgentemente substituir as batidas questões do tipo “ele me ama?” por outras mais salutares psicologicamente falando, tais como: “você acredita no amor? o que está fazendo para merecê-lo?”, “do que tem medo e te deixa inseguro(a) na relação?”, “que trauma, perda ou crise levou-o(a) a dificultar suas atuais relações?”, “como você se vê, sente-se atraente?”, “por que atrai o mesmo tipo de pessoa?”, “por que as relações acabam não dando certo, em que está contribuindo para tal?” dentre outras dezenas de perguntas que aqui poderia levantar. Podemos até responder as questões ditas básicas (sobre a outra pessoa e futuro do romance), mas antes, a prioridade é trabalhar o(a) consulente em sua dinâmica afetiva.
Atenção tarólogo(a): pare com essa tendência de supervalorizar a relação ou o(a) parceiro(a) do(a) consulente! A grande sacada é primeiro orientar a pessoa em suas dificuldades e não prometer “romances duradouros ou términos súbitos” sem dar condições ao indivíduo de se transformar. Paremos, pois, de alimentar questões amorosas repetitivas na rede, pois isso não é inteligente e não o(a) torna um(a) profissional renomado(a)!
Para refletir: "quer tornar o mundo um lugar melhor? Ajude a tornar as pessoas melhores."
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25/07/2010 15:58:32
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Tânia Regina Soares - 12/10/2010 16:27:51
Olá Giancarlo, Adorei seu posicionamento e seriedade com essa prática tão séria quando se trata de relações humanas. Tenho esse perfil de trabalho com o tarô, não me deixo levar por essa mesmice do consulente nas suas realções afetivas. Para mim, não têm como interpretar as cartas sem levar em consideração a "condição afetiva" do consulente, que precisa ser situado dentro da sua "história". Não têm como praticar o tarô sem o suporte da Psicologia.
Parabéns
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Giancarlo Kind Schmid - 14/10/2010 11:54:21
Oi Tânia, Obrigado por suas palavras e visita. Tomando sua frase final: "Não têm como praticar o tarô sem o suporte da Psicologia", essa é uma premissa que se tornará cada vez mais importante, fundamental. Tirar cartas, todo mundo sabe, ajudar o consulente a ser alguém melhor, é o desafio. Cansei de ver pessoas entrando e saindo da área, porque achavam que bastava "ler" o tarô e já estariam preparadas; sem sensibilidade para com o outro, as leituras se tornam vazias e insignificantes. Acertar previsões? Até o povo Paul(da Copa) é capaz de fazer! O bom tarólogo não é aquele que apenas acerta, mas certamente é aquele que conserta. Abraço!
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Beatriz - 17/10/2010 14:55:28
Giancarlo Embora eu venha ao site para aprender um pouco mais sobre o tarô, o que muito me fascina, tenho me deparado com tuas colocações objetivas e sérias. Isso fortalece a imagem do site para alguém pragmático como eu, e reforça a idéia de que o futuro não está ainda escrito, pode ter uma tendência. Depende de nós e de nossas atitudes o que realmente vai acontecer. Obrigada pela racionalidade generosa ao enfocar esse assunto. Abraços
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Giancarlo Kind Schmid - 17/10/2010 15:17:58
Oi Beatriz, Obrigado a você, pelas incentivadoras palavras. Abraços!
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Magali - 30/10/2010 18:12:30
Olá, tudo bem? Meu nome é Magali, sou taróloga há vinte anos e venho acompanhando seu trabalho há alguns anos. Adorei seu artigo. Muito bom. Gostaria de aproveitar esta oportunidade para parabenizá-lo pelo excelente trabalho que vem desenvolvendo ao longo dos anos para a comunidade esotérica. Grande beijo.
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Giancarlo Kind Schmid - 31/10/2010 17:08:16
Oi Magali, Agradeço seu gentil retorno. Incentivo vindo de uma pessoa como você, com a experiência que possui, só me enche de motivação e satisfação para continuar minha jornada. Beijo retribuído!
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fernanda - 21/11/2010 17:12:26
um dia desse comum da semana um amigo me pediu p ler o taro e com perguntas..vou ser feliz..fulano vai me ajudar..e faço tal coisa!? demorei umas tres semanas p responde-lo. bom resolvi enviar um e mail com seguintes dizeres: que ele deverei decidir o que quer fazer, p onde ir,e melhorar os relacionametos nao colocando a responsabilidade nas"pessoas" de como ser e fazer..confiança". assim poderei mais na frente ler o taro.sim.bom sei que ele nao me respomdeu pois ate agora nao me retornou.mas achei melhor assim ele tinha um vicio danado de querer que eu lesse o taro a todo momento! alias talvez seria a hora dele assumir suas responsabilidades!? entao foi assim que aconteceu...
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Giancarlo Kind Schmid - 21/11/2010 19:37:36
Oi Fernanda, O mais importante é que tenha oferecido ao seu consulente o poder de escolha, tirando de cima de si (e do tarô) a total responsabilidade para com a história de seu consulente. Muitos imaginam que podem destinar ao tarólogo e ao tarô (ou qualquer outro oráculo) a palavra final sobre determinadas decisões; quem o faz certamente não está disposto a assumir a sua parte nos riscos. É aquela velha história: se algo não deu certo, a culpa é do oráculo. Mas, só existem consulentes que agem assim porque existem tarólogos que assumem-se detentores do futuro alheio. Não somos nada mais que intérpretes, cabe a nós educar os consulentes e conscientizá-los de seus papéis. É bom ganharmos o nosso dinheirinho com aqueles que nos procuram? Natural! Mas, o que estamos fazendo pelo consulente? No seu caso, muito provavelmente ele procurará outro praticante para resolver suas questões. Caso contrário, ele terá amadurecido o suficiente para entender o seu recado. Abraço!
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