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03 de maio de 2024

Responsável: Constantino K. Riemma


O Recipiendário (O Iniciado)
Eliphas Levi
 
 
Esse texto ajuda a estabelecer correlações simbólicas entre a antiga arte-ciência da Magia e o caráter operativo do personagem do Arcano I do Tarô, o Mago.
Trata-se da transcrição do 1º capitulo, Vol. I, de Dogma e Ritual da Alta Magia, traduzido do original francês por Rosabis Camaysar e publicado pela Editora Pensamento, pags. 71-81.
Na revisão dessa versão ao português tomamos a liberdade, em algumas passagens, de atualizar o tratamento verbal e adicionar ilustrações para dar mais fluídez à leitura. [C.K.R.]
 
1. A
Disciplina - Ensoph - Kether
Quando um filósofo tomou para base de uma nova revelação da sabedoria humana este raciocínio: "Penso, logo existo", ele mudou de algum modo e à sua vontade, conforme a revelação cristã, a noção antiga do Ente supremo. Moisés faz dizer ao Ente dos entes: "Eu sou quem sou". Descartes [filósofo, físico e matemático francês, 1596-1651] faz dizer ao homem: "Eu sou aquele que pensa", e como pensar é falar interiormente, o homem de Descartes pode dizer como o Deus de S. João Evangelista: "Eu sou aquele em quem está e por quem se manifesta o Verbo". In princípio erat verbum.
Que é um princípio? É uma base de palavra, é uma razão de ser do verbo. A essência do verbo está no princípio: o princípio é o que é; a inteligência é um princípio que fala.
Que é a luz intelectual? É a palavra. Que é a revelação? É a palavra; o ente é o princípio, a palavra é o meio e a plenitude ou o desenvolvimento, e a perfeição do ente é o fim: falar é criar.
Porém, dizer "Eu penso, logo existo", é concluir da consequência ao princípio, e recentes contradições levantadas pelo grande escritor Lamennais [filósofo e escritor político francês, 1782-1854] a imperfeição filosófica deste método. Eu sou logo existe alguma coisa, nos parece uma base mais primitiva e mais simples da filosofia experimental.
Eu sou logo o ente existe.
Ego sum qui sum: eis aí a revelação primordial de Deus no homem e do homem no mundo, e é também o primeiro axioma da filosofia oculta.
Eu Sou
O ser é o ser
Esta filosofia tem, pois, por princípio o que existe, e nada tem de hipotético nem de casual.
Mercúrio Trismegisto [ou Hermes Trismegistus, personagem mítico da Antiguidade greco-egípcia] inicia o seu admirável símbolo, conhecido sob o nome de Tábua de Esmeralda, por esta tríplice afirmação: "É verdade, é certo sem erro, é absolutamente verdade". Assim, a verdade confirmada pela experiência em física, a certeza desembaraçada de qualquer mistura de erro em filosofia, a verdade absoluta, indicada, pela analogia, no domínio da religião ou do infinito, tais são as primeiras necessidades da verdadeira ciência, e é o que só a magia pode dar aos seus adeptos.
Mercurius Trismegistus ou Hermes Trismegisto
Mercurius Trismegistus
www.s273.photobucket.com
 
Mas, antes de tudo, quem é você que tem este livro entre as suas mãos e o começou a ler?...
No frontispício de um templo que a antiguidade dedicara ao deus da luz, lia-se esta inscrição em duas palavras: "Conhece-te a ti mesmo".
Tenho o mesmo conselho a dar a qualquer homem que queira aproximar-se da ciência.
A magia, que os antigos chamavam o sanctum regnum, o santo reino, ou o reino de Deus, regnum Dei, só é feita para os reis e padres; você é padre? você é rei? O sacerdócio da magia não é um sacerdócio vulgar e a sua realeza nada tem que debater com os príncipes deste mundo. Os reis da ciência são os sacerdotes da verdade, e o seu reino fica oculto para a multidão, como os seus sacrifícios e as suas preces. Os reis da ciência são os homens que conhecem a verdade e que a verdade os tornou livres, conforme a promessa formal do mais poderoso dos iniciadores.
O homem que é escravo das suas paixões ou dos preconceitos deste mundo não poderia ser um iniciado; ele nunca se elevará, enquanto não se reformar; não poderia, pois, ser um adepto, porque a palavra adepto significa aquele que se elevou por sua vontade e por suas obras.
O homem que ama suas ideias e que tem medo de perdê-las, aquele que teme as verdades e que não está disposto a duvidar de tudo, antes do que admitir qualquer coisa ao acaso, esse deve fechar este livro, que lhe é inútil e perigoso; ele o compreende­ria mal e ficaria perturbado, mas ficaria muito mais se por acaso o compreendesse bem.
Se você está preso por alguma coisa ao mundo, mais que à razão, à verdade e à justiça; se a sua vontade é incerta e vacilante, quer no bem, quer no mal; se a lógica o espanta, se a verdade nua o faz corar; se você se sente ofendido, quando apontam seus erros, condene imediatamente este livro, e, não o lendo, faça como se ele não existisse para você. Porém não o difame como perigoso: os segredos que ele revela serão compreendidos por um pequeno número e aqueles que o compreenderem não o revelarão. Mostrar à noite a luz aos pássaros, é ocultá-la, pois que ela os cega e torna-se para eles mais obscura do que as trevas. Falarei, pois, claramente; direi tudo e tenho a firme confiança de que só os iniciados ou os que são dignos de o ser, lerão tudo e compreenderão alguma coisa.
Há uma verdadeira e uma falsa ciência, a magia divina e a magia infernal, isto é, mentirosa e tenebrosa. Temos que revelar uma e desvendar outra; temos de distinguir o mago do feiticeiro e o adepto do charlatão.
O mago dispõe de uma força que conhece, o feiticeiro procura abusar do que ignora.
O diabo — se é permitido num livro de ciência empregar esta palavra desacreditada e vulgar — o diabo se dá ao mago e o feiticeiro se dá ao diabo.
O mago é o soberano pontífice da natureza, o feiticeiro não passa de um profanador.
O feiticeiro é para o mago o que o supersticioso e o fanático são para o homem verdadeiramente religioso.
Antes de ir mais longe, definamos claramente a magia. A magia é a ciência tradicional dos segredos da natureza que nos vem dos magos. Por meio desta ciência, o adepto se acha investido de uma espécie de onipotência relativa e pode agir de modo que ultrapassa a capacidade comum dos homens.
É assim que vários adeptos célebres, tais como Hermes Trismegisto, Osíris, Orfeu, Apolônio de Thyana, e outros que poderia ser perigoso ou inconveniente mencionar, puderam ser adorados ou invocados depois da sua morte como deuses.
É assim que outros, conforme o fluxo e o refluxo da opinião, que faz os caprichos do êxito, tornaram-se agentes do inferno ou aventureiros suspeitos, como é caso do imperador Juliano, de Apuleio, do encantador Merlin e do arquifeiticeiro, como o chamavam no seu tempo, o ilustre e infeliz Cornélio Agripa.
Para chegar ao sanctum regnum, isto é, à ciência e ao poder dos magos, quatro coisas são indispensáveis: uma inteligência esclarecida pelo estudo, uma audácia que nada faz parar, uma vontade que nada quebra e uma discrição que nada pode cor­romper ou embebedar.
Saber, ousar, querer, calar eis os quatro verbos do mago que estão escritos nas quatro formas simbólicas ela esfinge. Estes quatro verbos podem se combinar mutuamente de quatro modos e se explicam quatro vezes uns pelos outros, tal como se pode ver no jogo do Tarô.
 
O Alquimista
O Alquimista
www.img.wikinut.com/The-Alchemist.jpeg
Na primeira página do livro de Hermes, o adepto é representado coberto com um largo chapéu, cuja aba, sendo dobrada, pode ocultar a sua cabeça inteira. Ele tem uma das mãos elevadas para o céu, ao qual parece governar com sua baqueta, e a outra mão no seu peito; tem diante de si os principais símbolos ou instrumentos da ciência, e esconde outros numa algibeira de escamoteador. O seu corpo e os seus braços formam a letra Aleph, a primeira do alfabeto, que os hebreus tiraram dos egípcios; porém, mais tarde, teremos ocasião de voltar novamente a este símbolo.
O mago é verdadeiramente o que os cabalistas hebreus chamam o microprosopo, isto é, o criador do mundo pequeno. Como primeira ciência mágica é o conhecimento de si mesmo, também a primeira de todas as obras da ciência, a que contém todas as outras e que é o princípio da grande obra, é a criação de si mesmo; este termo tem necessidade de ser explicado.
Por ser a razão suprema o único princípio invariável e, por conseguinte, imperecível, pois que a mudança é o que chamamos a morte, a inteligência que adere fortemente e de algum modo se identifica com este princípio, se torna, por isso mesmo, invariável, e, por conseguinte, imortal. Compreende-se que, para aderir invariavelmente à razão, é preciso ter-se tornado independente de todas as forças que produzem, pelo movimento fatal e necessário, as alternativas da vida e da morte. Saber sofrer, abster­se e morrer, tais são, pois, os primeiros segredos que nos põem acima da dor, dos desejos sensuais e do temor do nada. O homem que procura e acha uma gloriosa morte tem fé na imortalidade, e a humanidade inteira crê nela com ele e por ele, porque ela lhe eleva altares ou estátuas, em sinal de vida imortal.
O homem torna-se rei dos animais, somente se os dominar ou prender; de outro modo, seria sua vítima ou seu escravo. Os animais são a figura das nossas paixões, são as forças instintivas da natureza.
O mundo é um campo de batalha que a liberdade disputa à força da inércia, opondo-lhe a força ativa. As liberdades físicas são as moendas de que você será o grão, se não souber ser o moleiro.
O Pentáculo de Pitágoras e Ezequiel
Pentáculo de Pitágoras e Ezequiel
 
Somos chamados a ser o rei do ar, da água, da terra e do fogo; mas, para reinar sobre estes quatro animais do simbolismo, é preciso vencê-los e encadeá-los.
Aquele que aspira a ser um sábio e a saber o grande enigma de natureza deve ser o herdeiro e o espoliador da esfinge; deve ter a sua cabeça humana para possuir a palavra, as asas de águia para conquistar as alturas, os flancos de touro para cavar as profundezas, e as garras de leão para preparar lugar para si à direita e à esquerda, adiante e atrás.
Você, pois, que quer ser iniciado, é tão sábio como Fausto? É impassível como Jó? Não, não é verdade? Mas você poderá ser se quiser. Venceu os turbilhões dos pensamentos vagos? Não tem indecisões e caprichos? Não aceita o prazer só quando o quer, e não o quer só quando o deve? Não, não é verdade? Não é sempre assim? Mas isso pode ser, se você quiser.
A esfinge não tem somente uma cabeça de homem, ela tem também seios de mulher. E você? Sabe resistir às atrações da mulher?  Não sabe; não é verdade?!  Você ri
ao responder e se vangloria de sua fraqueza moral para glorificar em si próprio a força vital e material. Que seja, permito que você faça essa homenagem ao asno de Sterno e de Apuleio;  que o asno tenha seu mérito, dissonão discordo, pois era consagrado a Príapo, assim como o bode ao deus de Mendes. Mas vamos deixar pelo que é, e saibamos somente se é ele é o seu senhor ou você pode ser senhor dele. Pode verdadeiramente possuir a voluptuosidade do amor, somente quem venceu o amor pela voluptuosidade. Poder usar e se abster, é poder duas vezes. A mulher prende a você pelos seus desejos: seja senhor dos seus dos seus próprios desejos e prenderá a mulher.
A maior injúria que se possa fazer a um homem é chamá-lo de covarde. Ora, que é um covarde? Um covarde é aquele que negligencia o cuidado da sua dignidade moral, para obedecer cegamente aos instintos da natureza.
Em presença do perigo é, com efeito, natural ter medo e procurar fugir: por que, então, é uma vergonha? Porque a honra nos dá a lei de preferir nosso dever às nossas atrações e aos nossos temores. O que é, deste ponto de vista, a honra? É o pressentimento universal da imortalidade e a avaliação dos meios que podem levar a ela. A última vitória que o homem pode obter sobre a morte, é triunfar do gosto da vida, não pelo desespero, mas por uma esperança maior, que está contida na fé, por tudo o que é belo, honesto e do consentimento de todos.
Aprender a vencer a si próprio é, pois, aprender a viver, e as austeridades do estoicismo não eram uma vã ostentação de liberdade!
Ceder às forças da natureza é seguir a corrente da vida coletiva, é ser escravo das causas segundas.
Resistir à natureza e dominá-la é fazer para si uma vida pessoal e imperecível, é libertar-se das vicissitudes da vida e da morte.
Todo homem que está pronto a morrer ao invés de abjurar a verdade e a justiça, é verdadeiramente vivente, porque é imortal na sua alma.
Todas as iniciações antigas tinham por fim achar ou formar tais homens.
Pitágoras exercitava seus discípulos pelo silêncio e as abstinências de todo gênero; no Egito, os praticantes eram experimentados pelos quatro elementos; na Índia, é sabido a que prodigiosas austeridades os faquires e brâmanes se condenavam, para chegar ao reino da vontade livre e da independência divina.
Todas as macerações do ascetismo são tiradas das iniciações aos antigos mistérios e elas cessaram, porque os iniciáveis, não achando mais iniciadores, e os diretores de consciência tendo-se tornado, com o tempo, tão ignorantes como o vulgo, os cegos cansaram-se de seguir os cegos, e ninguém quis passar provas que só levavam à dúvida e ao desespero: o caminho da luz estava perdido.
 
Pitágoras
Pitágoras
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Para fazer alguma coisa é preciso saber o que se vai fazer, ou, ao menos, ter fé em alguém que o sabe.
Mas como arriscarei a minha vida à aventura e seguirei ao acaso aquele que nem mesmo sabe aonde vai?
No caminho das altas ciências, não convém empenhar-se temerariamente, mas, uma vez no caminho, é preciso chegar ou perecer. Duvidar é ficar louco; parar é cair; voltar para trás é precipitar-se num abismo.
Você, pois, que começou a leitura deste livro, se o compreendeis e quer ler até o fim, ele fará de você um monarca ou um insensato. Quanto a você, faça deste volume o que quiser, não poderá nem desprezá-lo nem esquecê-lo. Se você é puro, este livro será uma luz; se você é forte, ele será sua arma; se você é santo, será a sua religião; se você é sábio, ele regulará a vossa sabedoria.
Mas, se você for malvado, este livro será como que uma tocha infernal; ele despedaçará o seu peito, rasgando-o como um punhal; ficará na sua memória como um remorso; ele encherá a sua imaginação de quimeras e o levará pela loucura ao desespero. Se você procurar rir dele, só poderá ranger os dentes, porque este livro será para você como a lima da fábula que uma serpente tentou morder e que lhe quebrou todos os dentes.
Comecemos, agora, a série das iniciações.
Gravura sobre a Tábua de Esmeralda
Gravura representando a Tábua de Esmeralda gravada sobre um rochedo
Edição de Amphitheatrum Sapientiae Eternae (1610), versão latina do alquimista alemão Heinrich Khunrath.
www.fr.wikipedia.org/wiki/Table_d'émeraude
Disse que a revelação é o verbo. Com efeito, o verbo ou a palavra é o véu do ente e o sinal característico da vida. Toda forma é véu de um verbo, porque a ideia, mãe do verbo, é a única razão de ser das formas. Toda figura é um caractere, todo caractere pertence e volta a um verbo. É por isso que os antigos sábios, cujo chefe é Trismegisto, formularam o seu dogma nestes termos:
"O que está em cima é como o que está em baixo, e o que está em baixo é como o que está em cima."
Em outros termos, a forma é proporcional à ideia, a som­bra é a medida do corpo calculada em sua relação ao raio. A bainha é tão profunda quanto o comprimento da espada, a negação é proporcional à afirmação contrária, a produção é igual à destruição, no movimento que conserva a vida, e não há um ponto no espaço infinito que não seja centro de um círculo cuja circunferência se engrandece e se estende indefinidamente no espaço.
Toda individualidade é, pois, indefinidamente perfectível, porque o moral é análogo à ordem física, e porque não é possível conceber um ponto que não se possa dilatar, engrandecer e lançar raios num círculo filosoficamente infinito.
O que se pode dizer da alma inteira, deve-se dizer de cada faculdade da alma.
A inteligência e a vontade do homem são instrumentos de um valor e de uma força incalculáveis.
Mas a inteligência e a vontade têm por auxiliar e por instrumento uma faculdade muito pouco conhecida e cuja onipotência pertence exclusivamente ao domínio da magia: quero falar da imaginação, que os cabalistas chamam o diáfano ou o translúcido. Efetivamente, a imaginação é como que o olho da alma, e é nela que as formas se desenham e se conservam, é por ela que vemos os reflexos do mundo invisível, ela é o espelho das visões e o aparelho da vida mágica: é por ela que curamos as doenças, que influímos sobre as estações, que afastamos a morte dos vivos e que ressuscitamos os mortos, porque é ela que exalta a vontade e que lhe dá domínio sobre o agente universal.
A imaginação determina a forma da criança no ventre materno e fixa o destino dos homens; ela dá asas ao contágio e dirige as armas na guerra. Você está em perigo numa batalha? Acredite-se invulnerável como Aquiles e será como ele, diz Paracelso. O medo atrai as peças de artilharia e a coragem faz as balas retrocederem. É sabido que os amputados muitas vezes se queixam de incômodos nos membros que não têm. Paracelso operava no sangue vivo,  medicamentando  o  produto  de  uma sangria; curava as dores de cabeça à distância,
Paracelsus
 
operando em cabelos cortados; ele tinha excedido muito, pela ciência da unidade imaginária e da solidariedade do todo e das partes, todas as teorias, ou antes, todas as experiências dos nossos mais célebres magnetizadores. Por isso, as suas curas eram milagrosas, e ele mereceu que ajuntassem ao seu nome de Filipe Teofrasto Bombast o de Auréolo Paracelso, acrescentando-lhe ainda o epíteto de divino!
Paracelso, médico, alquimista, físico, astrólogo e ocultista suíço-alemão, nasceu em 1493, em Einsiedeln, perto de Zurique, e morreu em 1541, no hospital de Salzburgo, com apenas 47 anos. Seu pai, que era médico instruído, lhe ensinou o latim, a medicina e alquimia, e depois o mandou concluir seus estudos com Trithemo, que lhe ensinou a magia e a astrologia. Viajou quase toda a sua vida e visitou numerosos países, observando e estudando. A causa de sua morte não foi esclarecida. Uma hipótese é que teria sido assassinato por seus inimigos. (N. do T.)
Xilogravura de Astronomica et Astrologica, 1567.
A imaginação é o instrumento da adaptação do verbo.
A imaginação aplicada à razão é o gênio.
A razão é una, como o gênio é uno na multiplicidade das suas obras.
Há um princípio, há uma verdade, há uma razão, há uma filosofia absoluta e universal.
O que está na unidade considerada como princípio, volta à unidade considerada como fim.
Um está em um, isto é, tudo está em tudo.
A unidade é o princípio dos números, é também o princípio do movimento e, por conseguinte, da vida.
Todo o corpo humano se resume na unidade de um só órgão, que é o cérebro.
Todas as religiões se resumem na unidade de um só dogma, que é a afirmação do ser e da sua igualdade a si mesmo, o que constitui o seu valor matemático.
Não há mais do que um dogma em magia: o visível é a manifestação do invisível, ou, em outros termos, o verbo perfeito está nas coisas apreciáveis e visíveis, em proporção exata com as coisas inapreciáveis aos nossos sentidos e invisíveis aos nossos olhos.
O mago eleva uma das mãos para o céu e abaixa a outra para a terra, e diz: Lá em cima a imensidade! lá em baixo a imensidade ainda; a imensidade é igual à imensidade. Isto é verídico nas coisas visíveis, como nas coisas invisíveis.
Aleph Aleph, a primeira letra do alfabeto da língua sagrada, representa um homem que eleva uma das mãos ao céu, e abaixa a outra para a terra.
É a expressão do princípio ativo de todas as coisas, é a criação no céu, corresponde à onipotência do verbo aqui. Esta letra é, por si só, um pentáculo, isto é, um caractere que exprime a ciência universal.
A letra Alleph pode suprir aos signos sagrados do macrocosmo e do microcosmo, ela explica o duplo triângulo maçônico e a estrela brilhante de cinco pontas; porque o verbo é um e a revelação é uma. Deus, dando ao homem a razão, deu-lhe a palavra; e a revelação, múltipla nas suas formas, mas una no seu princípio, está inteira no verbo universal, intérprete da razão absoluta.
É o que quer dizer a palavra tão mal compreendida de catolicismo, que, na língua hierárquica moderna, significa infalibilidade.
O universal em razão é o absoluto, e o absoluto é o infalível.
Se a razão absoluta leva a sociedade inteira a crer irresistivelmente na palavra de uma criança, esta criança será infalível, da parte de Deus e da parte da humanidade inteira.
A fé não é outra coisa senão a confiança razoável nesta unidade do verbo.
Crer é concordar com o que não se sabe ainda, mas que a razão nos certifica antecipadamente de saber ou ao menos reconhecer um dia.
São, pois, absurdos os pretensos filósofos que dizem: "Não creio no que não sei".
Pobres homens! Se soubessem, haveria necessidade de crer? Mas posso eu crer ao acaso e sem razão?
— Não, certamente! A crença cega e ousada é a superstição e a loucura. É preciso crer nas coisas cuja existência a razão nos força a admitir conforme o testemunho dos efeitos conhecidos e apreciados pela ciência.
A ciência! Grande vocábulo e grande problema! Que é a ciência?...
Responderemos a esta pergunta no segundo capítulo deste livro.
Sobre o autor:
Eliphas Levi - veja sua apresentação em O Tarô / Esoterismo
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