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27 de abril de 2024

Responsável: Constantino K. Riemma


O Cavaleiro de Taças: herói místico
Glória Marinho
 
 
Do nascimento até a morte, todo
ser humano está sempre executando
o mito do herói e a luta com o dragão
.
Lutz Müller
 
Relembrando um artigo anterior – Rastreamento de Símbolos – nos reportamos a ele como referência para nos guiar na interpretação do Herói Místico, o Cavaleiro de Taças. O Cavaleiro de Espadas pertencente à estruturação heroica seria o Herói Puro. Chamamos o Cavaleiro de Paus de Herói Impuro (comedido) sempre preocupado com o bem estar social. Tratando-se do Cavaleiro de Ouros sua estruturação seria a Sintética.
Cavaleiro de Copas no Golden Tarot Botticelli
Cavaleiro de Copas
Golden Tarot Botticelli
 
O Cavaleiro de Taças em sua essência será visto como o Cavaleiro Percival em sua aventura na busca do Graal. O simbolismo da Taça é rico em interpretações, além de apresentar certa ambivalência. Possui na maioria das vezes, uma conotação religiosa. A taça que contivera vinho passou a ser vista como símbolo do Sagrado. A taça com água é o poder destruidor do dilúvio para o judaísmo, por exemplo. O Graal é um objeto sagrado desde o seu surgimento na literatura medieval, na crença de que nele estaria guardado também o sangue de Cristo, símbolo da imortalidade.
Na literatura islâmica três taças cheias de leite são vistas como símbolos de sua religiosidade. A lenda nos conta que foram os cavaleiros Templários que se empenharam na busca do Santo Graal. Esses cavaleiros, apesar de guiados por objetivos religiosos eram extremamente belicosos.
Na nossa escolha apenas o Cavaleiro de Taças é visto como o buscador do Graal, através do mito de Parsifal. O mito do Graal possui várias versões em suas descrições: Cálice, Pedra, Livro e Taça. A descrição mais interessante pertence às lendas do Ciclo do Graal – 1180 até 1230 – fazendo parte da literatura medieval. O mito do Graal é contado pelo alemão Wolfram von Eschera Bach com a informação de que o Graal teria sido escavado em uma pedra preciosa, uma esmeralda verde caída dos céus ou trazida pelos anjos. A pedra é chamada de exillis ou lapis exillis  (pedra que caiu do céu).  Era uma pedra poderosa com
poderes miraculosos produzindo a juventude eterna, a regeneração da vida.
Por sua vez, Malcom Godwin, escritor rosacruz, nos diz que no mito de Parzifal (Percival ou Parsifal) estariam escondidas informações astrológicas e alquímicas sobre como o indivíduo é transformado do corpo grosseiro em formas mais elevadas. São informações acessadas pela internet e em livros como o do Dr. Cavalli – Psicologia Alquimica: receitas antigas para viver num mundo melhor.
Antes de continuar, gostaríamos de fazer algumas considerações sobre o mito do herói. O mito é composto de eventos acontecidos in illud tempore (em tempos primordiais) de acordo com Mircea Eliade. Para que um mito vire lenda é necessário o acréscimo de visões culturais através dos tempos, chegando até nós de maneira fragmentada ou imaginativa e revestidos de outra forma, ou seja, remitologizados. Os heróis são eternos. Seu mito surgiu com os primeiros obstáculos que a humanidade enfrentou e servia para manter a saúde do Rei e de seus governantes. Atualmente, podemos nos considerar como heróis de nós mesmo. O Cavaleiro de Taças procura a perfeição através do sacrifício. A história de Parsifal está intrinsecamente ligada ao rei Arthur com a simbólica Távola Redonda, na busca do santo Graal. O mito do Graal nos emociona e fascina porque nos identificamos com ele em vários momentos da vida.
The Vision of the Holy Grail to Sir Galahad
A visão do Santo Graal por Galaad
Tela de Edward Burne-Jones - 1895-96 - Reprodução disponível em www.wikipedia.com
Faço minha as palavras de Carol Pearson quando diz o seguinte: Dentro de nós temos as principais características da história do Graal. A parte fragmentada, cindida e ferida do nosso ser – aquela que conhece o esplendor da Alma, mas não consegue relacionar esse esplendor com nossas vidas cotidianas – é o rei Fisher. O jovem cavaleiro é o Explorador que existe dentro de todos nós e quer ardentemente encontrar o Graal. Este nos oferece a capacidade de renovação, de perdão e de transformação.
Decerto, temos que a busca espiritual é também a busca da nossa transformação em pessoas melhores. Desde a antiguidade e durante a idade medieval os cavaleiros usavam o verde, cor da esmeralda, como um símbolo de vitalidade e transmutação nessa procura da espiritualidade. O simbolismo do Graal é de altíssimo grau de desenvolvimento espiritual podendo ser estabelecidas comparações com a pedra filosofal, e até mesmo com a tábua Esmeraldina. Estamos lembrando tudo isso apenas como ilustração do que foi dito.
Continuando com a nossa explanação diríamos que o Cavaleiro de Taças possui uma estruturação mística, querendo com isso dizer que os sentimentos e a busca do autoconhecimento são as metas de sua jornada, o que condiz com o conceito do Tarô, que é visto desde o seu nascimento como um caminho de autoconhecimento. A estrutura é a base da personalidade, incluindo a visão da vida (mundovisão) e seu propósito, as metas mais relevantes e a as atitudes para com os outros.
Além disso, pertencendo ao elemento Água suas emoções que são puras, extrapolam às vezes, perturbando a sua confiança. Essas emoções devem ser liberadas para que haja domínio de si, gerando a aceitação dos fatos. Essas transformações promovem a movimentação necessária para as mudanças rápidas.
Nessa estruturação Mística os conflitos não são reais, embora estejam sempre em constante movimentação acompanhados de perto pelas funções psíquicas do  Cavaleiro de Taças,  na busca de novas propostas.
 
A taça
Uma das inúmeras
representações
do Santo Graal
Sua família é espontânea, amorosa, solidária, possuindo a espiritualidade á flor da pele. Ele é uma pessoa extrovertida enquanto o seu Inconsciente é introvertido.
Há quatro palavras que servem para identificar a ação de cada um dos cavaleiros do tarô: Saber, Fazer, Querer Calar. O Saber pertence ao Cavaleiro de Ouros. O Fazer é de propriedade do Cavaleiro de Espadas. O Querer é acatado pelo Cavaleiro de Paus. Para o nosso Cavaleiro de Taças restou o Calar. Calar e escutar são a essência do Wu Wei, ensinado pelo Taoísmo. No dizer de Lutz Müller – no Calar, revelam-se a disciplina emocional, a autodeterminação, a autonomia, e, sem dúvida, a capacidade para a objetividade supra pessoal...
De acordo com Carol Pearson existem níveis de desenvolvimento para os heróis à medida que caminham na senda do seu destino. Os níveis do Cavaleiro de Taças são em número de três:
1. Conflito entre suas próprias necessidades e as necessidades dos outros,
2. Aprender a cuidar de si mesmo para que os cuidados dispensados às outras pessoas sejam algo que nos deixe enriquecidos e não mutilados,
3. Disposição para cuidar e para assumir a responsabilidade pelo bem estar de pessoas na construção da comunidade.
Graal
Sir Galahad, ou Persifal
Tela de Arthur Hughes (186501870)
Sendo a homogeneidade a característica principal do Herói místico, a ação, muitas vezes, converte-se em contemplação da tranquilidade, acontecendo nesse caso uma fuga da realidade na resolução dos problemas e na dedicação ao outro, esquecendo – se de si mesmo. Enquanto leva suas mensagens de boas mudanças, em sua maioria, o nosso Herói místico utiliza o “escudo de Perseu” para conseguir a tranquilidade e vencer seus medos. Esse escudo permite a ele a vivência da calma e da tranquilidade para agir. Através dos reflexos do escudo ele vê uma maneira de se proteger contra o medo e seus dragões (os problemas).
O Cavaleiro de Taças se nos apresenta no mito do Graal remitologizado, isto é, com roupagens novas. É um cavaleiro que nos traz uma Taça contendo um convite para um novo caminho. Caminho de paz, amor, alegria, tudo isso permeado com ideais elevados esperando despertar toda a sensibilidade que existe dentro de cada um de nós.
O Cavaleiro de Copas no Tarot Visconti Sforza
Cavaleiro de Copas
Tarocchi Visconti Sforza
 
No término de sua jornada o Cavaleiro de Taças retornará trazendo em suas mãos a Taça com a oferta de renascimento conseguida a duras penas. Ao encontrar o seu Graal precisará dividir a sua alegria com mais alguém.
O retorno feliz, ou seja, a progressão, é anunciada pelos símbolos opostos, após a reunião, diz Lutz Müller. “São quase sempre símbolos da luz: da ordem e da união, da primavera, (...) do verde e do colorido, (...) do sol e da luz, da Mandala, da formação de um bom contato com o semelhante, do companheirismo e da união sexual.”
Pertencente ao elemento Água, a intuição deste Cavaleiro juntamente com as emoções andam de braços dados e fazendo com ele faça previsões dos acontecimentos antecipadamente.
Possuindo a sua verdade interior não se deixa influenciar pelos outros, o que lhe permite uma certa abertura para uma maior compreensão, deixando a mente livre de preconceitos. Usando seus dons para o Bem ele terá o potencial de ver tudo transformar-se através dessa Verdade Interior.
A guisa de conclusão diria que o mito do Herói é o mais difundido e vivido nos tempos atuais. Somos todos heróis e consequentemente responsáveis pelas transformações, em primeiro lugar de nós mesmos, e depois da sociedade como um todo. Nossa jornada possui três estágios; a preparação, a jornada em si e o retorno, quer sejamos vitoriosos ou não.
O arquétipo do herói foi o escolhido para a reinterpretação dos Cavaleiros do Tarô entre outras razões, por promover a sua afirmação no mundo e apresentar potencialidades que serão atualizadas e através do fortalecimento de suas atitudes poderá alcançar o nível elevado de um arquétipo guerreiro. Guerreiro, Cavaleiro e Herói são sinônimos nas potencialidades. Todos os Cavaleiros possuem essas potencialidades, cada uma à sua maneira de Ser.
junho.12
Contato com a autora:
Glória Marinho é historiadora e antropóloga formada pela UFPE.
Atende pessoalmente, seguindo a linha junguiana: glorieta@bol.com.br
Outros trabalhos seus no Clube do TarôAutores
 
  Baralho Cigano
  Tarô Egípcio
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  I Ching
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