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Tarot e Qabbalah |
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No final do século 18, Anquetil Duperron e William Jones demonstraram respectivamente, o parentesco entre o persa, o sânscrito e as línguas européias antigas e modernas. Pesquisas posteriores confirmaram o parentesco e abriram caminho para estudos sobre Mitologia comparada (Schelling e os irmãos Grimm). |
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Um esquema da Árvore da Vida que aparece em
"Les Mysteres de la Kabbale" de Eliphas Levi. |
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A percepção de que hindus, persas e europeus formaram um só povo na Antiguidade, exaltou as imaginações trazendo novos materiais para as teorias racistas, e por outro lado colocando novamente em tela a questão da unicidade da humanidade primordial.
Este horizonte cultural era o que faltava para que as especulações renascentistas sobre uma Prisca Theologia voltassem à tona. Esta tarefa entrevista por Fabre de Olivet foi tomada a cargo com todo ímpeto por Eliphas Lévi, o abade Constant.
O parentesco lingüístico assinalado pelos eruditos autorizava uma verdadeira caçada aos equivalentes.
Se os Arcanos menores do Tarô tinham dez cartas numeradas e quatro naipes, e os Maiores, 22 cartas; por que não aproximar o sistema dos diagramas cabalísticos com suas dez sefirot, seus 4 mundos e 22 letras? Foi o que fez Lévi em Dogma e Ritual da Alta Magia, publicado em 1856. A partir de então se tornou prática corrente escrever alguma coisa sobre o tema e desenhar as letras hebraicas nas cartas dos Arcanos Maiores.
Será que esta analogia é fértil? |
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As analogias improdutivas |
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O mesmo símbolo pode ser apropriado e usado para diferentes propósitos e com significados variados; isto depende do período histórico, da base religiosa e da dimensão de realidade visada.
O núcleo de significados básicos das letras hebraicas não concorda com o das cartas dos Arcanos maiores. Tomemos um exemplo. A letra Guímel evoca a riqueza ou pobreza, o planeta Marte, o anjo Samael, o ouvido direito, a ligação entre Binah e Gevurah. Tudo isto tem pouco a ver com a carta da Imperatriz, a dissonância é tão grande que G.O.Mebes indica o planeta Vênus como o correspondente, e ao fazê-lo sai da esfera da Cabala judaica e cria outra coisa.
O mesmo problema acontece na comparação de outras letras e cartas.
Ao abordamos um conjunto, a primeira providência deve ser a verificação da composição, a estrutura.
No alfabeto hebraico a estrutura básica das letras é 3+7+12: |
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três letras-mães dispostas nos três caminhos horizontais da Árvore da Vida: |
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sete letras duplas dispostas nos caminhos verticais; |
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Beith |
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Guímel |
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Dálet |
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Caf |
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Pei |
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Reish |
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Tav |
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e doze letras elementares dispostas nas diagonais. |
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He |
Vav |
Zain |
Chet |
Tet |
Yud |
Lamed |
Nun |
Samech |
Ayin |
Tsadi |
Kuf |
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Nos arcanos maiores do Tarô não temos nada que lembre remotamente este esquema.
Tal analogia levaria a classificar o Mago, a Morte e o Louco como cartas matrizes, o que, não me recordo tenha ocorrido. |
A Árvore da Vida é um diagrama que resume dois milênios de investigações de místicos judaicos e assinala os aspectos coincidentes nos domínios teológico, cosmológico e antropológico, com profundas implicações para a terapêutica, magia cerimonial, artes mânticas e principalmente, práticas meditativas. Alterar qualquer coisa no desenho é esterilizar a prática.
Os desenhos da Árvore da Vida que comumente aparecem nos estudos de Tarô-Cabala, mostram as letras dispostas em ordem alfabética partindo de cima; neste caso a letra Aleph liga Kether a Chokmah.
Esta associação entre letras e caminhos da Árvore da Vida é uma especulação de autores cristãos, pois na realidade a letra Aleph liga Chesed a Guevurah.
Tomando a Árvore como diagrama no corpo humano esta região representa o tórax e a letra Aleph o elemento Ar. Colocar a Aleph no hemisfério direito do cérebro (Kether-Chokmah) significa que o sujeito pensa ao sabor da ventania.
Deus o tenha!
“Arcanos menores” é uma designação recente para o baralho comum, cuja origem podem ser buscada no Oriente, tendo chegado à Europa pelas mãos dos mulçumanos, e daí a denominação naibs para os quatro elementos (estrutura horizontal) o que tem pouco a ver com os quatro mundos dos cabalistas (estrutura vertical).
As dez sefirot da Árvore da Vida são atributos de Deus, as três superiores saem da passagem do livro do Êxodo quando Deus infunde seu Espírito, Sabedoria e Inteligência, para que Betzalel possa construir o tabernáculo. |
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Os caminhos da Ávore
e as letras,
tal como aparecem nos manuais
de Tarô, não coincidem
com os textos tradicionais. |
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Os nomes das sete inferiores foram tirados do livro das Crônicas quando o rei Davi profere uma oração consagrando Salomão como seu sucessor. Se a carta 1 não for lida na perspectiva de Espírito e vontade divina, a 2 na de Sabedoria do Pai Universal e assim por diante, a aproximação é puramente ornamental. |
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Tarô, uma mancia desprezada |
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Quando Court Gebelin escreveu Le Monde Primitif no final do século 18, o Tarô já existia como jogo e cartomancia havia 4 séculos. Suas origens não foram registradas e sua prática confinava-se a curiosos, nobres e pessoas simples. Com este autor tem início uma corrente esotérica que procura vincular o tarô a uma tradição, em seu caso, egípcia.
Lévi vinculou o Tarô à Cabala e Papus aos ciganos. Somente Oswald Wirth viu com clareza que as imagens eram européias, medievais e cristãs. Um dos grandes problemas da história do Tarô é investigar esta cegueira. Propomos aqui um início de discussão. |
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Depois de 600 anos de movimentos de povos e destruição, os europeus puderam respirar aliviados no século XI, experimentando uma revitalização econômica intensa com diversas conseqüências benéficas na esfera cultural e religiosa: o novo movimento monástico (Cluny e Cister), a organização das ordens militares, a construção das grandes catedrais românicas e góticas pela confraria maçônica, o início da poesia trovadoresca e das Cortes de Amor no Sul da França, e muitos outros.
Paralelamente a isto surgiram crises espirituais que se tornaram agudas: provas racionais da existência de Deus (Anselmo), as querelas de Investiduras, as heresias e a Inquisição, a subordinação do papado aos reis franceses (o cativeiro de Avignon) e o extermínio da Ordem dos Templários em 1310. |
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O Tarô é um dos tesouros salvos do naufrágio. Algumas das imagens foram copiadas diretamente das esculturas das Catedrais, como mostra Flournoy em A simbólica dos arcanos: uma peregrinação da alma.
A quantidade de imagens femininas remete para as Cortes de Amor provençais e os Fideli d’Amore italianos. Pesquisas na iconografia dos manuscritos alquímicos poderiam mostrar surpresas, bem como nos trabalhos dos mestres em iluminuras franceses e de Siena do início do século XIV. Eu arriscaria dizer que o desenho básico original foi realizado antes de 1348, pois toda a iconografia européia ficou marcada pela Peste Negra, da qual o Tarô está isento. |
A crise espiritual não terminou em 1310, ao contrário, prosseguiu célere com o Cisma (três papas simultâneos no final do século XIV), a Reforma e o impacto da emergência das ciências experimentais. Cento e cinqüenta anos depois do extermínio dos Templários, poucos conheciam o patrimônio esotérico acumulado no Cristianismo e promoveram uma verdadeira orgia eclética, um patê esotérico formado por fragmentos colhidos em diversas tradições: hermetismo greco-egípcio, neoplatonismo, pitagorismo, alquimia e magia islâmicas, e cabala judaica. |
Já estamos em pleno Renascimento e os autores que compunham a biblioteca básica de Lévi (Ficino, Mirandola, Postel, Reuchlin, Agrippa e outros), não escreveram uma linha sobre o Tarô. As razões possíveis: não conheciam a origem, não tomavam o baralho como material esotérico etc.
Pesquisar a origem do Tarô é embrenhar-se em assunto complicado: que caminhos tortuosos levaram os dirigentes cristãos da religião de amor dos Evangelhos até o canibalismo da primeira Cruzada e às torturas e fogueiras da Inquisição?
Na realidade o Tarô não precisa legitimar-se com associações a outras tradições. O núcleo de significados das cartas consolidou-se ao longo de séculos e insistir nas associações pode ser um estorvo. |
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Um tarólogo em exercício não deve se lembrar que a carta do Eremita corresponde à letra Theith, ao signo de Leão, à audição, ao rim esquerdo. Se o fizer vai ficar perplexo. |
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Qabbalah, essa desconhecida |
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O Sefer Yetzirah foi traduzido por Postel para o latim e impresso em 1552, dez anos antes da versão hebraica. O livro foi tomado como um manual de filologia, como um livro sobre os mistérios da criação, como um trabalho de cosmologia e muitos outros significados. E decerto, ele contém todas estas dimensões. Mas foi preciso esperar até 1990 quando Aryeh Kaplan escreveu um comentário pormenorizado sobre ele, para sabermos que se trata, antes de mais nada, das práticas meditativas. Os cabalistas judeus jamais escreveram sobre estes assuntos, a não ser Abraham Abulafia que pôs no papel alguns comentários sobre a permutação de letras como meio de prática espiritual, e por isto mesmo foi alvo de críticas na comunidade. Os europeus cristãos só tiveram acesso à literatura teórica, escrita num estilo especialmente barroco para manter os goim à distância, especialmente depois do tratamento que receberam na Europa medieval.
Durante 500 anos os ocidentais leram sobre o gosto do pudim sem poder experimentá-lo! Aqui não há contorno possível: para entrar em contato fértil com o budismo tibetano ou zen, com a Yoga hindu, com o sufismo islâmico, ou a Cabala judaica é preciso encontrar um instrutor originário destas tradições, conhecer a respectiva história, os livros sagrados e um pouco da língua. Isto agora se tornou possível.
É preciso conhecer a história judaica, pois as formas místicas acompanharam as mudanças e vicissitudes do povo. Podemos rastrear facilmente as influências egípcias e babilônicas (no léxico, na Torah, na literatura dos Palácios celestiais), persas (a angeologia e a demonologia, o julgamento final e a ressurreição dos corpos). |
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www.jimmyakin.org |
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Por onde andaram, os judeus absorveram influências, mas as retrabalharam na matriz da Torah. E assim, o que chamamos de Cabala foi o movimento originado na Europa mediterrânea medieval. O contexto: fundação da escola filológica de Córdoba no século X, fanatismo dos governantes almorávides e almoádas nos séculos XI e XII – acarretando uma diáspora para os reinos cristãos do Norte da Espanha – ambivalência suprema nesta convivência (guetos e marcas no vestuário) avanço do racionalismo aristotélico no judaísmo, escola de tradutores na Provença e eclosão do movimento dos cátaros e das Cortes de Amor nesta região. |
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Quando este contexto é ignorado restam manuscritos barrocos e um punhado de fórmulas para jogo intelectual. Este primeiro movimento visou, antes mais nada, explicar a presença do sofrimento e da desordem na criação. |
A aproximação entre Tarô e a Qabbalah foi feita por europeus cristãos. Não há registro de um escrito judaico tratando do Tarô, por dois bons motivos. Os judeus têm sua própria tradição mântica, antiga e complexa: uma astrologia muito diferente da que praticamos, uma guematria que deu origem à nossa numerologia, e uma fisiomancia baseada nos sinais da morfologia humana. O outro motivo é que os judeus levavam a sério o segundo mandamento, não farás imagens. A idéia de Lévi de desenhos figurativos inscritos nas pedras no peitoril dos sacerdotes (os Urim e Tumin), como modelo primordial do Tarô, é muito ingênua, pois isto seria considerado heresia na comunidade judaica. |
Depois de um século de extraordinário desenvolvimento, o XIII, a literatura cabalística refluiu. Novamente a história social em ação: a Inquisição tornou-se mais ativa, a discriminação contra os judeus idem: a depressão econômica, as más colheitas, a grande epidemia de Peste Negra que dizimou um terço da população européia ocidental; tudo atribuído aos deícidas que sofreram os primeiros pogroms. Este processo desembocou na expulsão dos judeus de Sefarad, a península Ibérica. 60 anos depois o movimento cabalístico estava baseado em Sefed na Palestina (território então do Império Otomano) com preocupações nitidamente messiânicas. Foi neste contexto de desastre que Mirandola e Reuchlin foram procurar judeus para aprender hebraico. Conseguiram e tiveram acesso aos manuscritos que logo foram traduzidos e impressos. Mas o significado interno do movimento cabalístico e as práticas que o fundamentavam ficaram perdidas. Nem sequer do movimento cabalista (séculos XII ao XVI) temos a história completa, pois 3 mil manuscritos foram publicados enquanto 6 mil aguardam sua vez nos museus, bibliotecas e sinagogas. |
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A sequência dos arcanos maiores |
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Para vincular o Tarô a alguma tradição esotérica era preciso demonstrar que a seqüência das cartas fazia sentido. Os primeiros baralhos não tinham numeração que só apareceu no século XVII, portanto resta uma dúvida sobre a intenção dos que criaram os Arcanos maiores. |
Podemos descartar o significado como sendo uma seqüência da vida biológica humana, pois a Morte está aproximadamente no meio da seqüência; e também do desenvolvimento típico da psicologia humana, pois este não existe, há somente a história psicológica do indivíduo sujeita a acidentes circunstanciais. Resta o trabalho espiritual.
Das muitas interpretações, as mais consistentes são as de Mebes, que toma a seqüência das cartas como os passos de preparação do adepto maçônico para a magia cerimonial; e a de Valentim Tomberg que toma a seqüência como os passos de exercícios espirituais na tradição cristã, matéria vasta, mas totalmente esquecida atualmente. |
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[autoria desconhecida] |
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Este é um assunto de vida ou morte para o Cristianismo romano. Na reatualização destas práticas jaz o futuro desta religião no mundo, e nota-se atualmente um grande interesse pelas práticas meditativas do Cristianismo Oriental que melhor conservou as tradições práticas. |
Na cartomancia corrente o problema do significado da seqüência não está colocado, o tarólogo lida com as demandas do consulente, que geralmente são concretas e individuais, enquanto a elaboração teórica só pode ser abstrata e geral. |
Já que este pequeno ensaio tentou dissipar mal-entendidos arraigados, não custa terminar com uma observação sobre Eliphas Lévi. Ainda que tenha escrito bastante sobre Magia e a tenha colocado como a grande Ciência da Antiguidade, ele pouco praticou magia cerimonial. Quanto às artes mânticas eis o que escreveu no Grande Arcano (1868): “Os adivinhos, tiradores de cartas e sonâmbulos são todos alucinados que adivinham por ob” [ob é um termo hebraico que designa uma luz astral expectral]. Eliphas Lévi percebeu horrorizado o declínio da religião em seu tempo e tudo que escreveu visava sua revitalização. Católico fiel acatou as restrições que os dirigentes eclesiásticos fizeram à sua obra e não publicou seus últimos manuscritos, o que ficou a cargo de seus sucessores franceses. |
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fevereirro.09 |
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