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21 de dezembro de 2024

Responsável: Constantino K. Riemma


Quatro de Espadas: da desistência à meditação
Reflexões a partir da obra “A Arte da Guerra” de Sun Tzu
Giancarlo Kind Schmid
No baralho Waite-Smith (Rider Waite) a imagem do arcano menor Quatro de Espadas é representada por um túmulo de pedra de um suposto cavaleiro, dentro de uma igreja ou catedral, tendo ao fundo um vitral com um motivo religioso. Três espadas pendem na parede, enquanto uma quarta encontra-se na lateral do sarcófago. Alguns interpretam a imagem como se fosse um homem repousando, em estado de oração; outros interpretam literalmente como um sepulcro. De qualquer modo, a ideia por detrás da figura é de pausa, recolhimento, introspecção, distanciamento ou economia de forças. Sucedendo o arcano Três de Espadas, que representa as dores intensas, porém passageiras, no Quatro de Espadas precisamos sair de cena para “lambermos nossas próprias feridas”. Nos embates da vida você perdeu a batalha, embora, acredite, pode não ter perdido a guerra. As limitações impostas pelo arcano sugerem que é improvável, no momento, você ter energia para lutar, é preciso se distanciar, parar e pensar: que estratégias estão sendo utilizadas ou se vale mesmo a pena insistir no embate. Escolhi um livro que nos ensina como enfrentar os infortúnios e superarmos a maior guerra que podemos enfrentar: aquela que travamos conosco.
Quatro de Espadas
O Dez de Espadas nos tarôs Rider-Waite e Marselha.
À direita, a tumba de um cavaleiro templário na igreja de Buslingthorpe, Lincolnshire (Inglaterra)
Na obra militar-filosófica chinesa “A Arte da Guerra” do estrategista Sun Tzu - no capítulo I (Da Avaliação) - pontua que “a arte da guerra implica cinco fatores principais, que devem ser o objeto de nossa contínua meditação e de todo o nosso cuidado, como fazem os grandes artistas ao iniciarem uma obra-prima. Eles têm sempre em mente o objetivo a que visam, e aproveitam tudo o que veem e ouvem, esforçando-se para adquirir novos conhecimentos e todos os subsídios que possam conduzi-los ao êxito. Se quisermos que a glória e o sucesso acompanhem nossas armas, jamais devemos perder de vista os seguintes fatores: a doutrina, o tempo, o espaço, o comando, a disciplina”. Sun continua: “a doutrina engendra a unidade de pensamento; inspira-nos uma mesma maneira de viver e de morrer, tornando-nos intrépidos e inquebrantáveis diante dos infortúnios e da morte”.
Na figura do Quatro de Espadas a ideia da figura de olhos fechados, em contrição, na posição de repouso sugere foco. Não existe a mínima possibilidade de dar o próximo passo sem saber o que queremos ou onde desejamos chegar. Uma vez definida tal atitude, é necessário assumir os riscos. E, não lamentar se perdemos uma batalha, pois, quando lamentamos, perdemos as forças para continuar enfrentando os desafios seguintes. De todo modo, em resumo, é necessária concentração no alvo, consciência dos riscos e resistências às perdas para conseguirmos ir até o final.
O autor postula a seguir que “se conhecermos bem o tempo, não ignoraremos os dois grandes princípios yin e yang, mediante os quais todas as coisas naturais se formam e dos quais todos os elementos recebem seus mais diversos influxos. Apreciaremos o tempo da interação desses princípios, para a produção do frio, do calor, da bonança ou da intempérie”. Como afirma o famoso ditado “o tempo é o melhor remédio”. Precisamos estar cientes que não podemos ganhar sempre. Vencer é bom, mas aprender com os erros nos fortalece. Para tanto, diante das dificuldades inerentes à vida, entender que as rotam nos reservam todo tipo de surpresas, muitas até exaustivamente desafiadoras. Assim é a vida: um dia de paz, um dia de lutas. Um dia se ganha, outro dia se perde. Mas, para quem está sempre pronto para a luta, perder sempre significa ganhar: você não se fortalece na glória, se fortalece com as feridas. Tudo tem seu tempo e sua hora. O Quatro de Espadas anuncia que é hora de nos recolhermos para melhor surgirmos no instante seguinte.
“O espaço, como o tempo, não é menos digno de nossa atenção. Se o estudarmos bem, teremos a noção do alto e do baixo; do longe e do perto; do largo e do estreito; do que permanece e do que não cessa de fluir”, segundo o autor. É normal que procuremos ajuda quando sentimos o duro golpe da vida. No Quatro de Espadas, o espaço reservado ao túmulo do cavaleiro sugere seu local sagrado, de honrarias e memórias que jamais devem ser apagar. É o momento que precisamos nos fechar em nosso quarto e chorar tudo que estamos sufocando, ficarmos a sós conosco, sem qualquer tipo de interferência externa. Esse timing se faz necessário como meio de recuperação, alívio da pressão interna, reconquista das forças internas, até como estímulo para um balanço pessoal. Portanto, após um duro golpe, não se intimide: reconheça que caiu para poder se levantar. Enquanto não aceitarmos que perdemos, continuaremos em “queda livre psíquica”. Só se levantar chegando no fundo. E precisamos respeitar esse período de recolhimento onde podemos avaliar, de fato, onde falhamos. “Entendo por comando a equidade, o amor pelos subordinados e pela humanidade em geral. O conhecimento de todos os recursos, a coragem, a determinação e o rigor são as qualidades que devem caracterizar aquele que investe a dignidade de general. São virtudes necessárias que devemos adquirira qualquer preço. Somente elas podem tornar-nos aptos a marchar dignamente à frente dos outros” afirma o estrategista.
No Quatro de Espadas a aparente fragilidade do personagem sugere que não conseguimos ser fortes todo tempo. Compreender nossas limitações, dificuldades ou mesmo temperamento é o primeiro passo para o fortalecimento. Se autoliderar significa tomar a dianteira da vida. E, ainda que estejamos sob pressões e fortes intempéries, as pessoas à volta não tem culpa de nossas agruras. O verdadeiro comando começa em não deixar que nossos problemas destruam o que conquistamos de bom, sejam nossas amizades, amores ou nossos sonhos. Antes de querermos ser exemplo para alguém, precisamos ser exemplo para nós mesmos.
Sun Tzu conclui: “aos conhecimentos acima mencionados convém acrescentar o de disciplina. Possuir a arte de ordenar as tropas; não ignorar nenhuma das leis da hierarquia e fazer com que sejam cumpridas com rigor; estar ciente dos deveres particulares de cada subalterno; conhecer os diferentes caminhos que levam a um mesmo lugar; não desdenhar o conhecimento exato e detalhado de todos os fatores que podem intervir; e informar-se de cada um deles em particular. Tudo isso somado constitui uma doutrina, cujo conhecimento prático não deve escapar à sagacidade nem à atenção de um general”. No Quatro de Espadas, um gládio está deitado enquanto outros três estão de pé. Não à toa, lembra os mesmos gládios que perfuram o coração no arcano anterior (Três de Espadas). Aqui, o sentido de disciplina envolve preparação e respeito às normas. Nos sugere só conseguiremos superar os desafios se respeitarmos nossos limites; que cada um é bom em alguma coisa, e que devemos respeitar quem é bom em algo diferente do que fazemos; que obedecermos não significa nos submetermos ou nos humilharmos – ao vivermos em sociedade precisamos entender que papel assumimos dentro da comunidade e ou grupos e como interferimos na ordem a partir de nossas ações; que alternar nas decisões é importante, pois fazer as coisas sempre da mesma forma leva-nos a obter sempre os mesmos resultados; não achar que sabemos tudo, pois a vida é contínuo aprendizado; e que precisamos ouvir a voz da experiência daqueles com mais cicatrizes que nós.
Quando somos capazes de atentar a esses cinco axiomas deixamos de desistir para meditar. Quando desistimos, “jogamos a toalha, entregamos os pontos”. O oponente vence por W.O. Quando meditamos e damos tempo para reunirmos forças para a próxima batalha, conseguimos sair mais íntegros, amadurecidos e preparados para não cairmos nas mesmas armadilhas que outrora fomos vítimas. O Quatro de Espadas nos ensina que a melhor de vencer um conflito é não entrarmos em conflito primeiro conosco. Porque, do contrário, serão duas batalhas a travar e, possivelmente, não teremos condições de enfrentar os desafios externos impostos, já que intimamente estaremos em “frangalhos”.
Giancarlo Kind Schmid
é tarólogo, astrólogo, numerólogo e terapeuta.
www.taroterapia.com.br  e  www.facebook.com/taroeterapia
Outros trabalhos seus no Clube do Tarô: Autores
Edição: CKR – 23/01/2017
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