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Encontros e desencontros na arte de ler símbolos! |
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Luiz Felipe Camargo Pinheiro |
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Tarô e Terapias - Caminhos possíveis, aplicações e experiências, foi o tema de um encontro para discussão e troca de experiências realizado em setembro de 2013, em São Paulo, com exposições de dois psicólogos, Teca Mendonça e Luiz Felipe Camargo Pinheiro, e do pedagogo, prof. de psicologia, Constantino K. Riemma. Acesse os textos no menu, acima. |
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A transcrição da gravação do evento e o copidesque do material ficou a cargo de Ivana Mihanovich, taróloga e colaboradora do Clube do Tarô. |
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O caráter terapêutico |
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Como psicólogo, sigo a linha junguiana coligada a trabalhos corporais. Uma das técnicas que uso no consultório é a calatonia, que foi desenvolvida pelo Prof. Sándor, um dos estudiosos que divulgou muitos dos conhecimentos de Jung. |
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Pethö Sándor, nasceu em 1916 na Hungria. Prestou serviços médicos durante a Segunda Guerra Mundial em hospitais da Cruz Vermelha da Europa. Terminada a Guerra mudou-se para o Brasil, onde se dedicou ao magistério superior na PUC-Sedes Sapientiae de São Paulo e à prática psicoterápica. Faleceu em 1992 deixando muito seguidores do método que desenvolveu. |
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Na verdade, atualmente eu sou ao mesmo tempo psicólogo e tarólogo, muito embora a prática do tarô tenha sido algo mais recente na minha vida. Eu diria que apesar de estudar o tarô desde 98, ele começou a fazer parte, profissionalmente, há mais ou menos sete anos. |
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Penso que é realmente interessante essas somas de conhecimento, em que descobrimos vários caminhos, que vão se entrelaçando, entremeando. A minha visão sobre um conhecimento mais amplo é o de poder fazer combinações, sem se fechar, sem se bitolar e, principalmente, não achar que um saber é melhor que o outro, ou que irá subjugar o outro. |
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Fazer essas conexões entre os saberes é, em minha opinião, a grande sacada, porque, ao ler cartas, basicamente você está falando de símbolos e símbolo é um assunto inesgotável. Penso, por isso, que devemos estar muito abertos, disponíveis, para tentar juntar o máximo de pecinhas desse vitral para compor uma imagem mais rica e completa. |
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Psicanálise: Freud e Jung |
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A questão da aplicação terapêutica no tarô é um assunto complexo, porque, para o senso comum, todo lazer – como jogos, esportes, momentos de relaxamento etc. – é visto como algo terapêutico. A origem da palavra "terapêutica" tem a ver com cuidado, com dedicarmos atenção a algo. Quando recuamos um pouco ao passado, vemos que tanto Freud quanto Jung desenvolveram os primórdios do que hoje chamamos de psicoterapia. Ao longo do tempo, ela foi reconhecida, desvinculada do modelo médico, mas esses autores representam as coisas do comecinho. Se olharmos como Freud construiu seu conhecimento, veremos que basicamente ele se desenvolveu em experiências com as pessoas que o procuravam. Inicialmente com a hipnose e depois deixando a hipnose de lado, ele construiu um conhecimento que, essencialmente, resultou da experiência dele. Mas se procurarmos o que havia de científico em tudo isso, uma das críticas que se faz ao Freud é justamente essa: será que se trata de um modelo realmente científico? Afinal, ele montou toda sua teoria com base nas pessoas que iam até ele. Será que isso é realmente aplicável para outras pessoas ou não? |
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É claro, que quem pratica as indicações freudianas sabe que funciona: é algo mais ou menos como acontece com o tarô. |
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No livro de Jung, Prática da Psicoterapia, logo no início ele trata dessa questão: O que é a psicoterapia? Ele diz o seguinte: antigamente mandava-se o paciente subir nas montanhas, ou tomar um banho frio, ou tentavam meia dúzia de tratamentos diferentes. Os problemas psicológicos eram um desafio com o qual, até pouco tempo atrás, na verdade ninguém sabia o que fazer. Os médicos estavam numa sinuca, porque não sabiam qual procedimento funcionaria realmente e, então, indicavam um monte de coisas ao mesmo tempo e depois não sabiam qual das opções tinha funcionado. Nesse texto, de 1930, ele diz: o que hoje estou fazendo, assim como o que Freud fez, são tentativas de lidar com um fenômeno; tentativas de abranger algo, sempre segundo as nossas experiências, segundo as nossas tentativas, segundo o que nos é possível. |
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É fácil perceber, portanto, que mesmo a ciência na qual a maioria de nós coloca tanta fé, se pensarmos no mundo pós-revolução industrial, considerando o primeiro mundo, onde a ciência passou pelo boom mais recente da nossa história, constatamos que todas as novidades datam somente uns cem anos, aproximadamente. E, quando paramos para pensar em tais fatos, percebemos que é muito pouco tempo para o investimento de tanta energia e que nada garante que os modelos criados serão eternos e universais. |
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Um dado importante dessa história é que Freud estava empenhado em fazer ciência realmente. Portanto, a palavra dele tinha que ser muito bem formulada para que toda a sua teoria tivesse validade. Ele queria mostrar que a psicanálise poderia seguir os métodos das ciências naturais; não das ciências humanas, mas das ciências naturais. Ou seja: algo reproduzível, algo que é comum a todos, algo que, a qualquer pessoa que chegar com “xis” patologia, eu vou poder aplicar e conseguir curar. |
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Colagem de Tito Fadel Camargo |
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O grande pulo do gato da obra do Freud é que ele colocou: “Isso aqui é ciência: é reproduzível, funciona”. Só que, ao mesmo tempo, conforme os casos iam chegando, às vezes tudo aquilo que ele acreditou até aquele momento não funcionava tão bem, ele achava um furo naquela teoria. Então recuava e dizia "Até aqui está certo, mas aquilo que eu acreditava antes não é bem assim, porque tal situação aconteceu e isso me forçou a rever". Então constatamos tópicos que foram reformulados, pontos da obra que passaram por revisão. |
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Quando Freud começa a dar corpo à sua teoria, com o Jung, ele contesta a escola suíça, justamente porque vai construindo uma forma de pensamento com base em questionamento, reflexão, revisão etc. Jung também começa seu trabalho aproximando-se de Freud: eles viveram uma lua de mel durante um período, Jung encantado com o colega que tinha mais experiência e que falava com muito sucesso do tratamento das neuroses, enquanto Jung estava mais focado em complexos. |
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Durante uma fase foi muito produtivo esse intercâmbio entre os dois; eles trocaram uma dezena de cartas, encontraram-se pouquíssimas vezes ao longo dos anos, mas inclusive conta-se que quando eles se encontraram pela primeira vez conversaram durante treze horas ininterruptamente. Há um dado importante em relação a esse encontro: até então a psicanálise estava sendo estigmatizada como uma ciência judaica, porque a sociedade de psicanálise era formada basicamente pelos médicos judeus que começaram a estudar e trabalhar naquela direção. De repente aparece esse médico da Suíça, de família protestante, estudioso dos mesmos temas. Desse modo, aquela linha de prática deixou de ser uma particularidade ou exclusividade dos médicos judeus de Viena. A entrada de Jung nesse círculo ajudou a quebrar esse estigma. Para Jung, no começo, o que o Freud versava era uma verdade universal. No entanto, ele rompe mais tarde quando percebe que Freud, de alguma forma, falava sobre a psicanálise nova, sobre um conhecimento que precisava ser divulgado, mas queria que a sua teoria fosse soberana e, por isso, descartava qualquer aparte ou divergência. |
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A validade terapêutica do tarô |
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Citados Freud, Jung e a psicanálise, voltemos à nossa questão sobre a validade terapêutica do tarô e sua possível intersecção (ou não) com a prática terapêutica tradicional. Para uns o tarô é nada, um simples joguete com cartas coloridinhas etc. Mas, para outros, ele pode ser um profundo instrumento de autoconhecimento, uma ferramenta para compreender as defesas, a forma de se relacionar, o que é o lado terapêutico dessa ferramenta. Estamos falando de algo que pode promover bem-estar, saúde, transformação. |
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Ilustração de Luiz Felipe |
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Um psicanalista que atua com Psicologia Institucional disse, certa vez, que a psicanálise nasceu como uma ciência visando a cura e que a psicoterapia é uma ciência que promove bem-estar. Nesse sentido, voltando lá para trás, o estímulo para promover bem-estar pode estar no jogo de futebol, num jogo de cartas recreativo e, às vezes, no próprio tarô, já que ele também pode promover o bem-estar. |
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É importante, porém, traçar uma linha demarcatória entre os territórios. Algumas pessoas que me procuram vêm em busca de terapia, outras procuram pelo tarô. Eu não ofereço a mescla dos dois caminhos, mas se há o gesto natural da pessoa no processo de terapia de querer também ler o tarô, marcamos outro horário específico para isso. |
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Mesmo por que, no caso de alguém que eu já conheça previamente, ao ler o tarô tenho que ser claro: "Olha, pode ser que muitas das coisas que eu veja nas cartas até esbarrem com o que a gente trabalha em terapia, só que hoje eu vou apenas ler cartas, então vou deixar alguns conhecimentos prévios que eu tenho de você de lado e falar somente o que eu vejo aqui.” |
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Além disso, eu acho que existem diferentes formas de ler cartas, diferentes formas de ler o tarô. Tem gente que lê de um modo mais intuitivo, outros que leem de forma mais prática. Para alguns vai ser associado a uma linguagem própria, para outros é puro símbolo, para outros mais é um instrumento de canalizar percepções, tanto que alguns dizem coisas que nem tem a ver com a carta que está ali. |
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Vejo que a forma de lidar com o tarô é muito variada e, claro, não tem uma melhor, nem uma pior. Aliás, essas diferenças levantam dúvidas, que aparecem muito frequente nos grupos de estudo: "Tem que ser intuitivo para ler o tarô?". Cada um vai encontrar sua forma pessoal de lidar com o tarô. Então, pode ser que você nunca desenvolva a intuição, por exemplo, mas vai encontrar uma forma pessoal de aplicar os conceitos-chave de cada carta na sua leitura, vai aprender a captar as expressões do outro (e isso, aliás, também é uma ferramenta auxiliar na psicoterapia). Se estudar com cuidado e atenção, certamente fará uma boa leitura. |
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